domingo, 1 de agosto de 2010

O CLAMOR DAS OCUPAÇÕES DE BELO HORIZONTE CHEGA A ONU.

O grito das 1.159 famílias das Comunidades-ocupações Dandara, Irmã Dorothy e Camilo Torres chega a ONU.
Maria do Rosário de Oliveira Carneiro

No dia 14 de julho de 2010, na Assembléia Legislativa de Minas Gerais – ALMG -, a Comissão de Direitos Humanos promoveu mais uma audiência pública para discutir a expedição de mandado de reintegração de posse em desfavor das 1.159 famílias que vivem nas comunidades-ocupações Dandara (no Céu Azul, em Belo Horizonte, MG), Irmã Dorothy e Camilo Torres (ambas, no Barreiro, na capital mineira).



Participou desta audiência um significativo número de apoiadores da luta destas famílias e também um número expressivo de autoridades, tais como o Procurador Geral do município de Belo Horizonte, Marco Antônio, enviado pelo prefeito Márcio Lacerda; o Secretário de Políticas Urbanas, Murilo Valadares; o presidente da URBEL, Claudius Vinicius; o Secretário de Habitação, Carlos Medeiros; o Administrador da Regional Pampulha (PBH) e outros servidores do Município. O Estado de Minas Gerais estava representado pelo Secretário de Estado para Desenvolvimento Regional e Urbano, Sebastião Navarro, e seu Secretário Adjunto.

Ao lado, crianças das comunidades Dandara, Camilo Torres e Irmã Dorothy nas escadarias da ALMG, no momento da Audiência na Comissão de Direitos Humanos. Só na Camilo Torres, em 2,6 anos de luta, nasceram 35 crianças. Nas três comunidades, entre as 5 mil pessoas ameaçadas de despejo há mais de 1.500 crianças que clamam pelo direito de viver com dignidade.

Quando da participação do Procurador Geral do município de Belo Horizonte na audiência pública, esse se limitou a protestar em nome do prefeito Márcio Lacerda contra uma carta que o prefeito recebeu da UNANIMA, ONG ligada à ONU, composta por congregações religiosas femininas e coordenada pelas irmãs Carmelitas de Vedruna. Segundo Marco Antônio, o prefeito Márcio Lacerda teria ficado muito indignado ao receber a carta de uma ONG de freiras de diversas congregações religiosas que atua na ONU. A pedido do deputado Durval Ângelo, Presidente da Comissão de Direitos Humanos, a carta então foi lida pelo procurador do município. Eis, abaixo, a carta:

“Ilmo. Sr. Márcio Lacerda
Prefeito de Belo Horizonte – MG
Moradia, direito humano, direito de todo o povo!

Somos da UNANIMA Internacional, coalizão de congregações de irmãs Católicas Apostólicas Romanas comprometidas a trabalhar pela paz e pela dignidade humana em resposta às necessidades de nosso mundo mediante o serviço a nossos membros na Organização das Nações Unidas – ONU – e em outras ONGs por meio da colaboração, da educação e da ação.
Recebemos a grave notícia de que a Prefeitura do Município de Belo Horizonte tem se negado a receber uma Comissão das Ocupações/Comunidades Camilo Torres, Dandara e Irmã Dorothy para diálogo e negociação das reivindicações que estas Comunidades apresentam, no seu justo direito à moradia. E não bastasse isso, também tem tratado seu movimento e luta como caso de polícia, investindo contra mulheres, crianças e idosos, tropas de choque, cães policiais além de outras formas injustas e desumanas. A Polícia Militar tem agido com truculência e abuso de poder, dificultando o direito de manifestação exercido pelas ocupações através das marchas realizadas pelos moradores das referidas ocupações quando, ocuparam a praça central da cidade (Praça 7 de setembro), de 11 a 14 de maio de 2010. Os militares agiram com truculência e violência impedindo o povo de dormir, e fizeram uso de palavras e expressões violentas contra o povo que pacificamente reivindicava o diálogo com o poder público. O povo das Ocupações são pessoas que lutam por seus legítimos e sagrados direitos. São pessoas humanas, filhas e filhos de Deus e, como tal, devem ser tratados.
Por isso, vimos por meio desta, denunciar estes desmandos e, ao mesmo tempo requerer, junto a este órgão público competente, a seguinte reivindicação: a intermediação do Governo Municipal no conflito relativo às três comunidades em epígrafe, com o objetivo de se estabelecer uma mesa de negociação tendente a assegurar uma saída digna e legal para as cerca de 1200 famílias ameaçadas de desalojamento forçado. Esse espaço de diálogo e negociação permitirá avaliar as inúmeras possibilidades legais de resolução do caso que não passem pela mera reintegração de posse do imóvel com a demolição de centenas de casas e uso da força policial. Roga-se, assim, pela pronta intermediação do Governo a ser iniciada com uma audiência entre o Exmo. Prefeito do Município de Belo Horizonte e uma comissão formada por dois representantes de cada comunidade, na qual serão expostas as possibilidades colocadas pelo movimento, bem como a posição e as propostas formuladas pela Prefeitura e, por fim, dado os encaminhamentos devidos.
Aguardando o desenrolar deste processo, esperamos que se abram canais de diálogo e negociação para que, efetivamente, as reivindicações deste povo organizado pelas Brigadas Populares e pelo Fórum de Moradia do Barreiro possam ser ouvidas, encaminhadas e concretizadas e, assim, Belo Horizonte deixe de ostentar a triste e contraditória posição, segundo o último informe da ONU, de ser uma das cidades mais desiguais do mundo.
Atenciosamente,”
Pela UNAMINA, Irmãs Carmelitas de Vedruna.
Uma carta semelhante também foi enviada ao Governador de Minas Gerais, Antonio Augusto Anastasia. No meio do povo que lotava um auditório na ALMG, alguém comentou: “O nosso clamor chegou a ONU e está incomodando as autoridades!”
As 1.159 famílias das três comunidades - Dandara, Irmã Dorothy e Camilo Torres -retornaram da audiência conscientes de que devem seguir empenhadas na luta, esperançosas pela possibilidade do diálogo que se abriu nesta audiência e muito felizes por tomar conhecimento de que seus clamores chegaram a ONU através da UNANIMA. De fato, estas comunidades contam com um grande número de apoiadores nacionais e internacionais e a notícia desta carta confirmou este dado importante.
Na Audiência, Sebastião Navarro, Secretário do governador, agendou reunião com representantes das comunidades para o dia 16 de julho, às 9 horas, na SEDRU.
Desde o surgimento destas ocupações-comunidades, muitas são as manifestações de apoio de entidades religiosas, faculdades e universidades através de estudantes e professores, distintas escolas públicas e privadas de Belo Horizonte, doutrinadores e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento que escrevem sobre a legitimidade desta luta, além do crescente apoio da comunidade do entorno e da grande Belo Horizonte.
É grande a força do povo organizado através dos diversos movimentos, pastorais, ONGs, sindicatos, igrejas, entidades e tantas formas de apoio popular. Acreditamos que as comunidades Dandara, irmã Dorothy e Camilo Torres, assim como tantas outras lutas organizadas juntam-se e somam-se em um único clamor: o clamor que denuncia toda forma de exclusão, sobretudo quando as políticas públicas não são pensadas na ótica dos pobres e com a intenção de cumprir um sagrado princípio e objetivo republicano, que é o de diminuir as desigualdades sociais.
Acreditamos que toda essa gama de apoio às comunidades-ocupações Dandara, Irmã Dorothy e Camilo torres, assim como a tantas pessoas sem-teto e sem-terra, revela uma nova visão de sociedade onde se destaca um grande número de pessoas e entidades que lutam bravamente por um novo modelo de cidade onde a justiça social e a dignidade da pessoa humana sejam efetivas, porque acreditamos em um outro mundo possível e em uma cidade onde caibam todos e todas.
Belo Horizonte, 20 de julho de 2010, dia do profeta Elias.
Pátria Livre! Venceremos!
Para maiores informações, consulte www.ocupacaodandara.blogspot.com e www.brigadaspopulares.org

Nenhum comentário:

Postar um comentário