sábado, 25 de dezembro de 2010

SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR

HOMILIA DO SANTO PADRE BENTO XVI

Basílica Vaticana
24 de Dezembro de 2010



Amados irmãos e irmãs!

«Tu és meu filho, Eu hoje te gerei» – com estas palavras do Salmo segundo, a Igreja dá início à liturgia da Noite Santa. Ela sabe que esta frase pertencia, originariamente, ao rito da coroação do rei de Israel. O rei, que por si só é um ser humano como os outros homens, torna-se «filho de Deus» por meio do chamamento e entronização na sua função: trata-se de uma espécie de adopção por parte de Deus, uma acta da decisão, pela qual Ele concede a este homem uma nova existência, atraindo-o para o seu próprio ser. De modo ainda mais claro, a leitura tirada do profeta Isaías, que acabámos de ouvir, apresenta o mesmo processo numa situação de tribulação e ameaça para Israel: «Um menino nasceu para nós, um filho nos foi concedido. Tem o poder sobre os ombros» (9, 5). A entronização na função régia é como um novo nascimento. E, precisamente como recém-nascido por decisão pessoal de Deus, como menino proveniente de Deus, o rei constitui uma esperança. O futuro assenta sobre os seus ombros. É o detentor da promessa de paz. Na noite de Belém, esta palavra profética realizou-se de um modo que, no tempo de Isaías, teria ainda sido inimaginável. Sim, agora Aquele sobre cujos ombros está o poder é verdadeiramente um menino. N’Ele aparece a nova realeza que Deus institui no mundo. Este menino nasceu verdadeiramente de Deus. É a Palavra eterna de Deus, que une mutuamente humanidade e divindade. Para este menino, são válidos os títulos de dignidade que lhe atribui o cântico de coroação de Isaías: Conselheiro admirável, Deus forte, Pai para sempre, Príncipe da paz (9, 5). Sim, este rei não precisa de conselheiros pertencentes aos sábios do mundo. Em Si mesmo traz a sapiência e o conselho de Deus. Precisamente na fragilidade de menino que é, Ele é o Deus forte e assim nos mostra, face aos pretensiosos poderes do mundo, a fortaleza própria de Deus.

Na verdade, as palavras do rito da coroação em Israel não passavam de palavras rituais de esperança, que de longe previam um futuro que haveria de ser dado por Deus. Nenhum dos reis, assim homenageados, correspondia à sublimidade de tais palavras. Neles, todas as expressões sobre a filiação de Deus, sobre a entronização na herança dos povos, sobre o domínio das terras distantes (Sal 2, 8) permaneciam apenas presságio de um futuro – como se fossem painéis sinalizadores da esperança, indicações apontando para um futuro que então era ainda inconcebível. Assim o cumprimento da palavra, que tem início na noite de Belém, é ao mesmo tempo imensamente maior e – do ponto de vista do mundo – mais humilde do que a palavra profética deixava intuir. É maior, porque este menino é verdadeiramente Filho de Deus, é verdadeiramente «Deus de Deus, Luz da Luz, gerado, não criado, consubstancial ao Pai». Fica superada a distância infinita entre Deus e o homem. Deus não Se limitou a inclinar o olhar para baixo, como dizem os Salmos; Ele «desceu» verdadeiramente, entrou no mundo, tornou-Se um de nós para nos atrair a todos para Si. Este menino é verdadeiramente o Emanuel, o Deus-connosco. O seu reino estende-se verdadeiramente até aos confins da terra. Na imensidão universal da Sagrada Eucaristia, Ele verdadeiramente instituiu ilhas de paz. Em todo o lado onde ela é celebrada, temos uma ilha de paz, daquela paz que é própria de Deus. Este menino acendeu, nos homens, a luz da bondade e deu-lhes a força para resistir à tirania do poder. Em cada geração, Ele constrói o seu reino a partir de dentro, a partir do coração. Mas é verdade também que «o bastão do opressor» não foi quebrado. Também hoje marcha o calçado ruidoso dos soldados e temos ainda incessantemente a «veste manchada de sangue» (Is 9, 3-4). Assim faz parte desta noite o júbilo pela proximidade de Deus. Damos graças porque Deus, como menino, Se confia às nossas mãos, por assim dizer mendiga o nosso amor, infunde a sua paz no nosso coração. Mas este júbilo é também uma prece: Senhor, realizai totalmente a vossa promessa. Quebrai o bastão dos opressores. Queimai o calçado ruidoso. Fazei com que o tempo das vestes manchadas de sangue acabe. Realizai a promessa de «uma paz sem fim» (Is 9, 6). Nós Vos agradecemos pela vossa bondade, mas pedimos-Vos também: mostrai a vossa força. Instituí no mundo o domínio da vossa verdade, do vosso amor – o «reino da justiça, do amor e da paz».

«Maria deu à luz o seu filho primogénito» (Lc 2, 7). Com esta frase, São Lucas narra, de modo absolutamente sóbrio, o grande acontecimento que as palavras proféticas, na história de Israel, tinham com antecedência vislumbrado. Lucas designa o menino como «primogénito». Na linguagem que se foi formando na Sagrada Escritura da Antiga Aliança, «primogénito» não significa o primeiro de uma série de outros filhos. A palavra «primogénito» é um título de honra, independentemente do facto se depois se seguem outros irmãs e irmãs ou não. Assim, no Livro do Êxodo, Israel é chamado por Deus «o meu filho primogénito» (Ex 4, 22), exprimindo-se deste modo a sua eleição, a sua dignidade única, o particular amor de Deus Pai. A Igreja nascente sabia que esta palavra ganhara uma nova profundidade em Jesus; que n’Ele estão compendiadas as promessas feitas a Israel. Assim a Carta aos Hebreus chama Jesus «o primogénito» simplesmente para O qualificar, depois das preparações no Antigo Testamento, como o Filho que Deus manda ao mundo (cf. Heb 1, 5-7). O primogénito pertence de maneira especial a Deus, e por isso – como sucede em muitas religiões – devia ser entregue de modo particular a Deus e resgatado com um sacrifício de substituição, como São Lucas narra no episódio da apresentação de Jesus no templo. O primogénito pertence a Deus de modo particular, é por assim dizer destinado ao sacrifício. No sacrifício de Jesus na cruz, realiza-se de uma forma única o destino do primogénito. Em Si mesmo, Jesus oferece a humanidade a Deus, unindo o homem e Deus de uma maneira tal que Deus seja tudo em todos. São Paulo, nas Cartas aos Colossenses e aos Efésios, ampliou e aprofundou a ideia de Jesus como primogénito: Jesus – dizem-nos as referidas Cartas – é o primogénito da criação, o verdadeiro arquétipo segundo o qual Deus formou a criatura-homem. O homem pode ser imagem de Deus, porque Jesus é Deus e Homem, a verdadeira imagem de Deus e do homem. Ele é o primogénito dos mortos: dizem-nos ainda aquelas Cartas. Na Ressurreição, atravessou o muro da morte por todos nós. Abriu ao homem a dimensão da vida eterna na comunhão com Deus. Por fim, é-nos dito: Ele é o primogénito de muitos irmãos. Sim, agora Ele também é o primeiro duma série de irmãos, isto é, o primeiro que inaugura para nós a vida em comunhão com Deus. Cria a verdadeira fraternidade: não a fraternidade, deturpada pelo pecado, de Caim e Abel, de Rómulo e Remo, mas a fraternidade nova na qual somos a própria família de Deus. Esta nova família de Deus começa no momento em que Maria envolve o «primogénito» em faixas e O reclina na manjedoura. Supliquemos-Lhe: Senhor Jesus, Vós que quisestes nascer como o primeiro de muitos irmãos, dai-nos a verdadeira fraternidade. Ajudai-nos a tornarmo-nos semelhantes a Vós. Ajudai-nos a reconhecer no outro que tem necessidade de mim, naqueles que sofrem ou estão abandonados, em todos os homens, o vosso rosto, e a viver, juntamente convosco, como irmãos e irmãs para nos tornarmos uma família, a vossa família.

No fim, o Evangelho de Natal narra-nos que uma multidão de anjos do exército celeste louvava a Deus e dizia: «Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens que Ele ama» (Lc 2, 14). A Igreja ampliou, no hino «Glória...», este louvor que os anjos entoaram à vista do acontecimento da Noite Santa, fazendo dele um hino de júbilo sobre a glória de Deus. «Nós Vos damos graças por vossa imensa glória». Nós Vos damos graças pela beleza, pela grandeza, pela tua bondade, que, nesta noite, se tornam visíveis para nós. A manifestação da beleza, do belo, torna-nos felizes sem que devamos interrogar-nos sobre a sua utilidade. A glória de Deus, da qual provém toda a beleza, faz explodir em nós o deslumbramento e a alegria. Quem vislumbra Deus, sente alegria; e, nesta noite, vemos algo da sua luz. Mas a mensagem dos anjos na Noite Santa também fala dos homens: «Paz aos homens que Ele ama». A tradução latina desta frase, que usamos na Liturgia e remonta a São Jerónimo, interpreta diversamente: «Paz aos homens de boa vontade». Precisamente nos últimos decénios, esta expressão «os homens de boa vontade» entrou de modo particular no vocabulário da Igreja. Mas qual é a tradução justa? Devemos ler, juntas, as duas versões; só assim compreendemos rectamente a frase dos anjos. Seria errada uma interpretação que reconhecesse apenas o agir exclusivo de Deus, como se Ele não tivesse chamado o homem a uma resposta livre e amorosa. Mas seria errada também uma resposta moralizante, segundo a qual o homem com a sua boa vontade poder-se-ia, por assim dizer, redimir a si próprio. As duas coisas andam juntas: graça e liberdade; o amor de Deus, que nos precede e sem o qual não O poderemos amar, e a nossa resposta, que Ele espera e até no-la suplica no nascimento do seu Filho. O entrelaçamento de graça e liberdade, o entrelaçamento de apelo e resposta não podemos dividi-lo em partes separadas uma da outra. Ambas estão indivisivelmente entrançadas entre si. Assim esta frase é simultaneamente promessa e apelo. Deus precedeu-nos com o dom do seu Filho. E, sempre de novo e de forma inesperada, Deus nos precede. Não cessa de nos procurar, de nos levantar todas as vezes que o necessitamos. Não abandona a ovelha extraviada no deserto, onde se perdeu. Deus não se deixa confundir pelo nosso pecado. Sempre de novo recomeça connosco. Todavia espera que amemos juntamente com Ele. Ama-nos para que nos seja possível tornarmo-nos pessoas que amam juntamente com Ele e, assim, possa haver paz na terra.

Lucas não disse que os anjos cantaram. Muito sobriamente, escreve que o exército celeste louvava a Deus e dizia: «Glória a Deus nas alturas…» (Lc 2, 13-14). Mas desde sempre os homens souberam que o falar dos anjos é diverso do dos homens; e que, precisamente nesta noite da jubilosa mensagem, tal falar foi um canto no qual brilhou a glória sublime de Deus. Assim, desde o início, este canto dos anjos foi entendido como música vinda de Deus, mais ainda, como convite a unirmo-nos ao canto com o coração em júbilo pelo facto de sermos amados por Deus. Diz Santo Agostinho: Cantare amantis est – cantar é próprio de quem ama. Assim ao longo dos séculos, o canto dos anjos tornou-se sempre de novo um canto de amor e de júbilo, um canto daqueles que amam. Nesta hora, associemo-nos, cheios de gratidão, a este cantar de todos os séculos, que une céu e terra, anjos e homens. Sim, Senhor, nós Vos damos graças por vossa imensa glória. Nós Vos damos graças pelo vosso amor. Fazei que nos tornemos cada vez mais pessoas que amam juntamente convosco e, consequentemente, pessoas de paz. Amen.







MENSAGEM URBI ET ORBI
DE SUA SANTIDADE
BENTO XVI

Santo Natal, 25 de Dezembro de 2010



«Verbum caro factum est – o Verbo fez-Se carne» (Jo 1, 14).

Queridos irmãos e irmãs, que me ouvis em Roma e no mundo inteiro, é com alegria que vos anuncio a mensagem do Natal: Deus fez-Se homem, veio habitar no meio de nós. Deus não está longe: está perto, mais ainda, é o «Emanuel», Deus-connosco. Não é um desconhecido: tem um rosto, o rosto de Jesus.

Trata-se de uma mensagem sempre nova, que não cessa de surpreender, porque ultrapassa a nossa esperança mais ousada. Sobretudo porque não se trata apenas de um anúncio: é um acontecimento, um facto sucedido, que testemunhas credíveis viram, ouviram, tocaram na Pessoa de Jesus de Nazaré! Permanecendo com Ele, observando os seus actos e escutando as suas palavras, reconheceram em Jesus o Messias; e, ao vê-Lo ressuscitado, depois que fora crucificado, tiveram a certeza de que Ele, verdadeiro homem, era simultaneamente verdadeiro Deus, o Filho unigénito vindo do Pai, cheio de graça e de verdade (cf. Jo 1, 14).

«O Verbo fez-Se carne». Fitando esta revelação, ressurge uma vez mais em nós a pergunta: Como é possível? O Verbo e a carne são realidades opostas entre si; como pode a Palavra eterna e omnipotente tornar-se um homem frágil e mortal? Só há uma resposta possível: o Amor. Quem ama quer partilhar com o amado, quer estar-lhe unido, e a Sagrada Escritura apresenta-nos precisamente a grande história do amor de Deus pelo seu povo, com o ponto culminante em Jesus Cristo.

Na realidade, Deus não muda: mantém-se fiel a Si mesmo. Aquele que criou o mundo é o mesmo que chamou Abraão e revelou o seu próprio Nome a Moisés: Eu sou Aquele que sou… o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob… Deus misericordioso e compassivo, cheio de amor e fidelidade (cf. Ex 3, 14-15; 34, 6). Deus não muda: Ele é Amor, desde sempre e para sempre. Em Si mesmo, é Comunhão, Unidade na Trindade, e cada obra e palavra sua tem em vista a comunhão. A encarnação é o ápice da criação. Quando no ventre de Maria, pela vontade do Pai e a acção do Espírito Santo, se formou Jesus, Filho de Deus feito homem, a criação atingiu o seu vértice. O princípio ordenador do universo, o Logos, começava a existir no mundo, num tempo e num espaço.

«O Verbo fez-Se carne». A luz desta verdade manifesta-se a quem a acolhe com fé, porque é um mistério de amor. Somente aqueles que se abrem ao amor, são envolvidos pela luz do Natal. Assim sucedeu na noite de Belém, e assim é hoje também. A encarnação do Filho de Deus é um acontecimento que se deu na história, mas ao mesmo tempo ultrapassa-a. Na noite do mundo, acende-se uma luz nova, que se deixa ver pelos olhos simples da fé, pelo coração manso e humilde de quem espera o Salvador. Se a verdade fosse apenas uma fórmula matemática, em certo sentido impor-se-ia por si mesma. Mas, se a Verdade é Amor, requer a fé, o «sim» do nosso coração.

E que procura, efectivamente, o nosso coração, senão uma Verdade que seja Amor? Procura-a a criança, com as suas perguntas tão desarmantes e estimuladoras; procura-a o jovem, necessitado de encontrar o sentido profundo da sua própria vida; procuram-na o homem e a mulher na sua maturidade, para orientar e sustentar os compromissos na família e no trabalho; procura-a a pessoa idosa, para levar a cumprimento a existência terrena.

«O Verbo fez-Se carne». O anúncio do Natal é luz também para os povos, para o caminho colectivo da humanidade. O «Emanuel», Deus-connosco, veio como Rei de justiça e de paz. O seu Reino – bem o sabemos – não é deste mundo, e todavia é mais importante do que todos os reinos deste mundo. É como o fermento da humanidade: se faltasse, definhava a força que faz avançar o verdadeiro progresso, o impulso para colaborar no bem comum, para o serviço desinteressado do próximo, para a luta pacífica pela justiça. Acreditar em Deus que quis compartilhar a nossa história, é um constante encorajamento a comprometer-se com ela, inclusive no meio das suas contradições; é motivo de esperança para todos aqueles cuja dignidade é ofendida e violada, porque Aquele que nasceu em Belém veio para libertar o homem da raiz de toda a escravidão.

A luz do Natal resplandeça novamente naquela Terra onde Jesus nasceu, e inspire Israelitas e Palestinianos na busca duma convivência justa e pacífica. O anúncio consolador da vinda do Emanuel mitigue o sofrimento e console nas suas provas as queridas comunidades cristãs do Iraque e de todo o Médio Oriente, dando-lhes conforto e esperança no futuro e animando os Responsáveis das nações a uma efectiva solidariedade para com elas. O mesmo suceda também em favor daqueles que, no Haiti, ainda sofrem com as consequências do terramoto devastador e com a recente epidemia de cólera. Igualmente não sejam esquecidos aqueles que, na Colômbia e na Venezuela mas também na Guatemala e na Costa Rica, sofreram recentemente calamidades naturais.

O nascimento do Salvador abra perspectivas de paz duradoura e de progresso autêntico para as populações da Somália, do Darfour e da Costa do Marfim; promova a estabilidade política e social em Madagáscar; leve segurança e respeito dos direitos humanos ao Afeganistão e Paquistão; encoraje o diálogo entre a Nicarágua e a Costa Rica; favoreça a reconciliação na Península Coreana.

A celebração do nascimento do Redentor reforce o espírito de fé, de paciência e de coragem nos fiéis da Igreja na China continental, para que não desanimem com as limitações à sua liberdade de religião e de consciência e, perseverando na fidelidade a Cristo e à sua Igreja, mantenham viva a chama da esperança. O amor do «Deus-connosco» dê perseverança a todas as comunidades cristãs que sofrem discriminação e perseguição, e inspire os líderes políticos e religiosos a empenharem-se pelo respeito pleno da liberdade religiosa de todos.

Queridos irmãos e irmãs, «o Verbo fez-Se carne», veio habitar no meio de nós, é o Emanuel, o Deus que Se aproximou de nós. Contemplemos, juntos, este grande mistério de amor; deixemos o coração iluminar-se com a luz que brilha na gruta de Belém! Boas-festas de Natal para todos!

Economia Solidária

Economia Solidária é um jeito diferente de produzir, vender, comprar e trocar o que é preciso para viver. Sem explorar os outros, sem querer levar vantagem, sem destruir o meio ambiente. Cooperando, fortalecendo o grupo, cada um pensando no bem de todos e no próprio bem.


Considerando essas características, a economia solidária aponta para uma nova lógica de desenvolvimento sustentável com geração de trabalho e distribuição de renda, mediante um crescimento econômico com proteção dos ecossistemas. Seus resultados econômicos, políticos e culturais são compartilhados pelos participantes, sem distinção de gênero, idade e raça. Implica na reversão da lógica capitalista ao se opor à exploração do trabalho e dos recursos naturais, considerando o ser humano na sua integralidade como sujeito e finalidade da atividade econômica.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O GOVERNO LULA

Frei Betto




Anunciada a vitória de Lula nas eleições de 2002, publiquei em O GLOBO (28 ¤10 ¤2002), o artigo O amigo Lula. Encerrei-o com a frase: “Sobrevivente da grande tribulação do povo brasileiro, Lula é, agora, um vitorioso.”

Apoiado por ampla maioria da opinião pública brasileira (hoje, 87%), Lula governa o país há oito anos. Surpreendeu aliados e opositores. Lula é, também agora, um vitorioso – posso parafrasear-me.

Vivi sempre de meu trabalho, como recomenda o apóstolo Paulo. Por breves períodos mantive vínculo empregatício com a iniciativa privada. Recusei nomeações do poder público. Por considerar compatível com minha atividade pastoral, aceitei convite do presidente Lula para integrar, em 2003, sua assessoria especial no gabinete de Mobilização Social do Programa Fome Zero, ao lado de Oded Grajew.

Ali permaneci dois anos. Tive oportunidade de implantar dois programas de ampla capilaridade nacional e ainda vigentes: a Rede de Educação Popular, que atua segundo o método Paulo Freire na formação cidadã de beneficiários do Bolsa Família; e o Escolas Irmãs, que estabelece conexões solidárias entre professores e alunos de instituições de ensino.

Minha tarefa principal consistia em mobilizar a sociedade civil em prol do Fome Zero, sobretudo os Comitês Gestores que, eleitos democraticamente nos municípios, cuidavam do cadastro dos beneficiários e supervisionavam o cumprimento das condicionalidades do programa de erradicação da miséria.

Muitos prefeitos reagiram. Queriam a si o controle do Fome Zero. Temiam o despontar de novas lideranças locais via Comitês Gestores. Exigiam decidir, por razões eleitoreiras óbvias, quem entra e sai do cadastro. Por sua vez, o lobby do latifúndio – cerca de 200 parlamentares do Congresso – pressionava para o Fome Zero não efetivar a reforma agrária, que lhe asseguraria caráter emancipatório e constituía cláusula pétrea do programa do PT.

A Casa Civil deu ouvidos aos insatisfeitos. Tratou de substituir o Fome Zero por um programa de caráter compensatório e, até hoje, sem porta de saída, cujo cadastro é controlado pelos prefeitos: o Bolsa Família. Oded Grajew regressou a São Paulo, o ministro Graziano foi substituído, e eu, em dezembro de 2004, pedi demissão. Voltei a ser um feliz ING – Indivíduo Não Governamental.

Às vésperas de encerrar o governo Lula, avalio-o como o mais positivo de nossa história republicana. O Brasil mudou para melhor.

Entre 2001 e 2008, a renda dos 10% mais pobres cresceu seis vezes mais que a dos 10% mais ricos. A dos ricos cresceu 11,2%; a dos pobres, 72%. No entanto, há 25 anos, de acordo com o IPEA, metade da renda total do Brasil permanece em mãos dos 10% mais ricos. E os 50% mais pobres dividem entre si apenas 10% da riqueza nacional.

Sob o governo Lula, os mais pobres mereceram recursos anuais de R$ 30 bilhões; os mais ricos, através do mercado financeiro, foram agraciados, no mesmo período, com mais de R$ 300 bilhões, o que impediu a redução da desigualdade social.

Faltou ao governo diminuir o contraste social por meio da reforma agrária, da multiplicação dos mecanismos de transferência de renda e da redução da carga tributária nas esferas do trabalho e do consumo. E onerar as do capital e da especulação.

Hoje, os programas de transferência de renda do governo representam 20% do total da renda das famílias brasileiras. Em 2008, 18,7 milhões de pessoas viviam com menos de ¼ do salário mínimo. Não fossem as políticas de transferência, seriam hoje 40,5 milhões. Isso significa que o governo Lula tirou da miséria 21,8 milhões de pessoas.

É falácia alardear que, ao promover transferência de renda, o governo “sustenta vagabundos”. Isso ocorre quando não pune corruptos, nepotistas, licitações fajutas, malversação de dinheiro público. No entanto, a Polícia Federal prendeu, por corrupção, dois governadores.

Mais da metade da população do Brasil detém menos de 3% das propriedades rurais. E apenas 46 mil proprietários são donos de metade das terras. Nossa estrutura fundiária é idêntica à do Brasil império! E o empregador rural não é o latifúndio nem o agronegócio, é a agricultura familiar: ocupa apenas 24% das terras e emprega 75% dos trabalhadores rurais.

A inflação manteve-se abaixo de 5%, cerca de 11,7 milhões de empregos formais foram criados e o salário mínimo corresponde, hoje, a mais de US$ 200. Isso permitiu ao consumidor planejar melhor suas compras, facilitado por uma política de créditos consignados e a longo prazo, malgrado as elevadas taxas de juros.

O governo Lula não criminalizou movimentos sociais; buscou o diálogo, ainda que timidamente, com lideranças populares; melhorou as condições dos quilombos; demarcou terras indígenas como Raposa Serra do Sol.

Ao rechaçar a ALCA e zerar as dívidas com o FMI, Lula afirmou o Brasil como país soberano e independente. O que lhe permitiu manter confortável distância da Casa Branca e se aproximar da África, dos países árabes e da Ásia, a ponto de enfraquecer o G8 e fortalecer o G20, do qual participam países em desenvolvimento. Estreitou relações com a África do Sul, a Índia e a China, valorizou a UNASUL e rompeu o “eixo do mal” de Bush ao defender a autodeterminação de Cuba, Venezuela e Irã.

O governo termina sem que, nos oito anos de mandato, tenham sido abertos os arquivos das Forças Armadas sobre os anos de chumbo, nem apoiado iniciativas para entregar à Justiça os responsáveis pelos crimes da ditadura. O país continua sem qualquer reforma estrutural, como a agrária, a política, a tributária etc.

Na educação, o investimento não superou 5% do PIB, quando a Constituição exige ao menos 8%. Embora o acesso ao ensino fundamental tenha se universalizado, o Brasil se compara, no IDH da ONU, ao Zimbabwe em matéria de qualidade na educação. Os professores são mal remunerados, as escolas não dispõem de recursos eletrônicos, a evasão escolar é acentuada. Os programas de alfabetização de adultos fracassaram e o MEC se mostrou desastrado na aplicação do ENEM. De positivo, a ampliação das escolas técnicas e das universidades públicas, o sistema de cotas e o ProUni.

O SUS continua deficiente, enquanto o atendimento de saúde é progressivamente privatizado. Hoje, 44 milhões de brasileiros estão inscritos em planos de saúde da iniciativa privada. Mais de 50% dos domicílios do país não possuem saneamento, os alimentos transgênicos são vendidos sem advertência ao consumidor, os direitos das pessoas portadoras de deficiências não são devidamente assegurados.

Governar é a arte do possível. Implica imprevistos e exige improvisos. Lula soube fazê-lo com maestria. Espero que o governo Dilma possa aprimorar os avanços da administração que finda e corrigir-lhe as falhas, sobretudo na disposição de efetuar reformas estruturais e ampliar o rigor na preservação ambiental. Tomara que a presidente consiga superar a deficiência congênita de sua gestão: o matrimônio, por conveniência eleitoral, entre o PT e o PMDB.

PS: O poder não muda ninguém, faz com que as pessoas se revelem.

Carta do Ministério das Cidades ao Juiz do Barreiro

MINISTÉRIO DAS CIDADES Secretaria Nacional de Programas Urbanos SAUS Quadra 01, lote 1/6 - Edifício Telemundi II- T andar 70070-010-Brasília DF Tel.: (061) 2108.1696 - Fax: (61) 2108.1449
80160.000045/2010-6T
Ofício n° Q0 d^f /2010/DPU/SNPU/MCIDADES
Brasília, ^>5 de outubro de 2010.
A Sua Excelência o Senhor Dr. Delvan Barcelos Júnior
Juiz de Direito
3o Vara Cível Regional do Fórum Barreiro - Comarca de Belo Horizonte Avenida Sinfrônio Brochado, 835 - Barreiro - Belo Horizonte - MG CEP 30640-000
Assunto: Reintegração de Posse na Comunidade Irmã Dorothy Stang
Processo Ia Instância: 0056753-19.2010.8.13.0024
Senhor Juiz,
1. O Ministério das Cidades tem, entre suas atribuições, a definição e a implementação, em parceria com Estados e Municípios, da política habitacional e de regularização fundiária, especialmente para a população de baixa renda, promovendo condições não só de moradia, mas de acesso a terra urbanizada e melhoria das condições urbanas.
2. A Secretaria Nacional de Programas Urbanos, na qualidade de responsável pelo trato dos casos de conflitos fundiários urbanos encaminhados ao Ministério das Cidades, conforme Portaria n° 587 do Ministério das Cidades, de 1 dezembro de 2008, foi procurada por representantes da Comunidade Irmão Dorothy Stang no dia 05 de agosto de 2010 demandando a inserção do Ministério das Cidades no sentido da criação de um espaço de articulação intergovernamental e orientação para viabilização de solução habitacional definitiva para as famílias envolvidas como alternativa ao despejo iminente. Novamente, no dia 23 de setembro de 2010 foi realizada reunião nas dependências deste ministério para tratar da pauta de reivindicações da Comunidade Irmã Dorothy, localizada na Rua Córrego do Capão, 20, Barreiro/Vila Santa Rita em Belo Horizonte.
3. De acordo com as informações fornecidas pelos representantes dos movimentos de moradia, no imóvel existe uma comunidade numerosa com cerca de 128 famílias, totalizando mais de 500 moradores, dentre as quais cento e cinqüenta crianças.

4. Com o intuito de buscar soluções pacíficas para os casos de conflitos fundiários urbanos e de garantir os direitos constitucionais, dentre eles a moradia, esta secretaria tem atuado

como facilitadora do diálogo e como articuladora dos agentes envolvidos nos conflitos urbanos.
6. Sabendo da iminência da desocupação do imóvel devido a uma ação juc principalmente, por ainda não haver uma solução para as famílias de modo a garantir o difè^ò moradia, solicitamos que seja avaliada a possibilidade do adiamento da reintegração de posse, 3e~ modo a propiciar que a comunidade e os diversos órgãos governamentais atinentes à questão possam efetivar uma solução habitacional para o caso em tela, podendo contar, inclusive, com recursos de programas habitacionais do Governo Federal, o que abre possibilidades concretas para se avançar em tais soluções.
7. Por fim, segue em anexo a Resolução Recomendada n° 87, de 8 de dezembro de 2009, do Conselho das Cidades, que trata da Política Nacional de Prevenção e Mediação de Conflitos Fundiários Urbanos, para conhecimento.
8. Agradecendo antecipadamente a acolhida da nossa sugestão, colocamo-nos à disposição para outros esclarecimentos que se fizerem necessários.




JCUK
Celso Santofé Carvalho
Secretário Nacional de Programas Urbanos Substituto

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

"Guerra às drogas encarcera mais negros do que apartheid"

sex, 2010-12-10 11:38 — admin
Entrevistas
Para jurista, guerra se dirige aos mais vulneráveis socialmente

10/12/2010



Renato Godoy de Toledo

da Redação



A juíza aposentada do Rio de Janeiro, Maria Lucia Karam, afirma que a criminalização do usuário que ainda persiste no Brasil viola declarações internacionais e e a própria Constituição brasileira. Karam faz parte da Apilcação da Lei contra a Proibição (Leap, na sigla em inglês). Segundo a juíza, a guerra às drogas nos EUA - que serve de referência para outros países - já propicia um quadro de encarceramento da população negra que ultrapassa os indíces do regime do apartheid na África do Sul.



Judicialmente, o usuário de drogas ainda é tratado como criminoso? Na sua opinião, quais mudanças na legislação poderiam tornar o relacionamento do judiciário com o usuário mais humano?

Maria Lucia Karam: Sim, o usuário de drogas ilícitas ainda é tratado como criminoso no Brasil. A Lei 11.343/2006 – a vigente lei brasileira em matéria de drogas – ilegitimamente criminaliza a posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas em seu artigo 28, ali prevendo penas de advertência, prestação de serviços à comunidade, comparecimento a programa ou curso educativo e, em caso de descumprimento, admoestação e multa. A Lei 11.343/2006 apenas afastou a previsão de pena privativa de liberdade.

Não se trata de tornar o relacionamento do Poder Judiciário com o usuário mais humano. Na realidade, o mero fato de usar drogas ilícitas não deveria levar ninguém a se relacionar com o Poder Judiciário. A criminalização da posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas viola princípios garantidores de direitos fundamentais inscritos nas declarações internacionais de direitos e nas constituições democráticas, aí naturalmente incluída a Constituição Federal brasileira. A simples posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas, ou seu consumo em circunstâncias que não envolvam um perigo concreto, direto e imediato para terceiros são condutas que dizem respeito unicamente ao indivíduo que as realiza, à sua liberdade, às suas opções pessoais. Condutas dessa natureza não podem sofrer nenhuma intervenção do Estado, não podem sofrer nenhuma sanção. Em uma democracia, a liberdade do indivíduo só pode sofrer restrições quando sua conduta atinja direta e concretamente direitos de terceiros.



A guerra às drogas tem um cunho social? Isto é, ela atinge majoritariamente os mais pobres? Se sim, a sra. considera que essa é uma estratégia pensada propositadamente para atingir os mais pobres?

A “guerra às drogas” não se dirige propriamente contra as drogas. Como qualquer outra guerra, dirige-se sim contra pessoas – nesse caso, os produtores, comerciantes e consumidores das drogas tornadas ilícitas. Como acontece com qualquer intervenção do sistema penal, os mais atingidos pela repressão são – e sempre serão – os mais vulneráveis econômica e socialmente, os desprovidos de riquezas, os desprovidos de poder.

No Brasil, os mais atingidos são os muitos meninos, que, sem oportunidades e sem perspectivas de uma vida melhor, são identificados como “traficantes”, morrendo e matando, envolvidos pela violência causada pela ilegalidade imposta ao mercado onde trabalham. Enfrentam a polícia nos confrontos regulares ou irregulares; enfrentam os delatores; enfrentam os concorrentes de seu negócio. Devem se mostrar corajosos; precisam assegurar seus lucros efêmeros, seus pequenos poderes, suas vidas. Não vivem muito e, logo, são substituídos por outros meninos igualmente sem esperanças. Os que sobrevivem, superlotam as prisões brasileiras.

Nos EUA, pesquisas apontam que, embora somente 13,5% de todos os usuários e “traficantes” de drogas naquele país sejam negros, 37% dos capturados por violação a leis de drogas são negros; 60% em prisões estaduais por crimes relacionados a drogas são negros; 81% dos acusados por violações a leis federais relativas a drogas são negros. Os EUA encarceram 1.009 pessoas por cem mil habitantes adultos. Se considerados os homens brancos, são 948 por cem mil habitantes adultos. Se considerados os homens negros, são 6.667 por cem mil habitantes. Sob o regime mais racista da história moderna, em 1993 – sob o apartheid na África do Sul – a proporção era de 851 negros encarcerados por cem mil habitantes. Como ressalta Jack A. Cole, diretor da Law Enforcement Against Prohibition-LEAP – organização internacional que reúne policiais, juízes, promotores, agentes penitenciários e da qual orgulhosamente faço parte – é o racismo que conduz a “guerra às drogas” nos EUA.

Na Europa, a mesma desproporção se manifesta em relação aos imigrantes vindos de países pobres.

A função da “guerra às drogas” – ou do sistema penal em geral – de criminalização dos mais vulneráveis e de conseqüente conservação e reprodução de estruturas de dominação não é exatamente uma estratégia pensada propositadamente pelo político A ou B; é sim algo inerente ao exercício do sempre violento, danoso e doloroso poder punitivo.



As experiências de legalização/descriminalização das drogas têm ajudado a diminuir a violência em função do tráfico?

As experiências menos repressivas na atualidade limitam-se à descriminalização da posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas. A descriminalização da posse para uso pessoal das drogas ilícitas é um imperativo derivado da necessária observância dos princípios garantidores dos direitos fundamentais inscritos nas declarações internacionais de direitos e nas constituições democráticas. A posse de drogas para uso pessoal, como antes mencionado, é uma conduta que não atinge concretamente nenhum direito de terceiros e, portanto, não pode ser objeto de qualquer intervenção do Estado.

Mas essa imperativa descriminalização não é suficiente. Não haverá nenhuma mudança significativa, especialmente no que concerne à violência, a não ser que a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas possam se desenvolver em um ambiente de legalidade. Para afastar os riscos e os danos da proibição, para pôr fim à violência resultante da ilegalidade, é preciso legalizar a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas.

A legalização da produção e do comércio de todas as drogas afastará a violência que hoje acompanha tais atividades, pois essa violência só se faz presente porque o mercado é ilegal. ão são as drogas que causam violência. A produção e o comércio de drogas não são atividades violentas em si mesmas. É a ilegalidade que cria a violência. A produção e o comércio de drogas só se fazem acompanhar de armas e de violência quando se desenvolvem em um mercado ilegal. A violência não provem apenas dos enfrentamentos com as forças policiais, da impossibilidade de resolução legal dos conflitos, ou do estímulo à circulação de armas. Além disso, há a diferenciação, o estigma, a demonização, a hostilidade, a exclusão, derivados da própria ideia de crime, a sempre gerar violência, seja da parte de agentes policiais, seja da parte daqueles a quem é atribuído o papel do “criminoso” – ou pior, do “inimigo”.

A produção e o comércio de álcool ou de tabaco se desenvolvem sem violência – disputas de mercado, cobranças de dívidas, tudo se faz sem violência. Por que é diferente na produção e no comércio de maconha ou cocaína? A óbvia diferença está na proibição, na irracional política antidrogas, na insana e sanguinária “guerra às drogas”.

Aliás, o exemplo de legalização que podemos invocar é o que ocorreu nos EUA na década de 1930, com o fim da proibição do álcool. O proibicionismo produziu e inseriu no mercado produtor e distribuidor do álcool empresas criminalizadas; fortaleceu a máfia de Al Capone e seus companheiros; provocou a violência que caracterizou especialmente a cidade de Chicago daquele tempo. Com o fim da chamada Lei Seca (o Volstead Act), o mercado do álcool se normalizou e aquela violência que o cercava simplesmente desapareceu.

Deliberação do Conselho Estadual dos Direitos Humanos

DELIBERAÇÃO N. 001/2010



O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos – CONEDH –, em reunião extraordinária realizada hoje, dia 16 de dezembro de 2010, na sala de reuniões do colegiado, sita nesta Capital, na Rua da Bahia, 1.148, 3º andar, tomando conhecimento da gravidade da situação das cerca de 1.200 famílias que se encontram residindo nas ocupações “Dandara”, localizada na Região da Nova Pampulha, e “Camilo Torres”, do Distrito Industrial do Vale do Jatobá, região do Barreiro, e CONSIDERANDO:



1 - a informação de que o despejo das famílias estaria na iminência de ser realizado por Oficial de Justiça com apoio da Policia Militar de Minas Gerais, sem que o Poder Público tenha assegurado local adequado para o reassentamento das famílias que possuem grande número de mulheres, crianças, idosos em situação de vulnerabilidade social extrema;



2 – que o Decreto Estadual n. 32.880, de 11/09/1991, ao regulamentar o funcionamento do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos, atribuiu-lhe expressamente no art. 2º para: “I – receber representação que contenha denúncia de violação dos direitos da pessoa humana, apurar sua procedência e veracidade e tomar providências capazes de fazer cessar os abusos, sejam da responsabilidade de particular ou de autoridade; [...] II – cooperar com as autoridades constituídas no que concerne à iniciativa de à execução de medidas que visem a assegurar o efetivo respeito dos direitos e das liberdades fundamentais do homem; [...] VIII – manter entendimentos com titulares e dirigentes de órgãos e entidades da Administração Estadual e Municipal visando coibir abusos de poder de qualquer natureza e, em especial, a perseguição a servidores por motivos ideológicos ou políticos; [...] X – executar atividades correlatas e adotar medidas outras no resguardo dos direitos humanos”;



3 – que o Decreto Estadual n. 35.661, de 27/06/1994, ao aprovar o Regimento Interno do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos, previu que este órgão possui competência para: “I – receber representação que contenha denúncia de violação dos direitos humanos, apurar sua veracidade e procedência e notificar às autoridades competentes sobre a coação, no sentido de fazerem cessar os abusos praticados por particular ou por servidor público; [...] IV – representar à autoridade policial ou ao Ministério Público no sentido de se instaurar sindicância ou processo administrativo, ou inquérito Policial, visando a imposição de pena disciplinar e/ou ação penal respectiva, contra o agente que praticar ato de violação dos direitos humanos; [...] V – manter entendimentos com titulares e dirigentes de órgãos e entidades da Administração visando a coibir abusos de poder de qualquer natureza e, em especial, a perseguição a servidores por motivos ideológicos ou políticos; [...] VI - encaminhar às autoridades competentes os pareceres ou relatórios conclusivos das comissões, em virtude das representações que lhes tenham sido apresentadas, sobre violação de direitos humanos, solicitando as providências cabíveis; [...] XIII – executar atividades correlatas, estabelecer convênios com entidades e órgãos afins e adotar medidas outras no resguardo e defesa dos direitos humanos”;



4 – Considerando a criação de Comissão Especial deste Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos – CONEDH –, para acompanhamento da situação das famílias das chamadas ocupações “Dandara” e “Camilo Torres”;



5 – Considerando que o Direito à Moradia se constitui em direito social fundamental inerente à dignidade da pessoa humana, estando expressamente reconhecido na Constituição da República Federativa do Brasil e em diversos tratados e convenções assinados e ratificados pelo Estado Brasileiro no plano internacional;



6 – e, finalmente, as decisões do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais proferidas nos autos dos Agravos de Instrumento ns. 1.0024.10.035.660-9/002 e 1.0024.10.035.660-9, nas quais ficou decidida expressamente a necessidade da: “... observância da Lei Estadual nº 13.604/2000, na qual determina-se que o processo de desocupação de áreas invadidas para assentamento urbano será objeto de acompanhamento por comissão especial”, reconhecendo a plena vigência da referida Lei.



DELIBEROU, por unanimidade dos conselheiros presentes, a expedição de ofícios dirigidos ao Governo do Estado de Minas Gerais, ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, à Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais, à Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, à Secretária de Estado de Defesa Social, à Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, à Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, ao Ministério das Cidades da República Federativa do Brasil, ao Município de Belo Horizonte, na pessoa de seus dirigentes, em caráter de urgência, solicitando:



1. que o cumprimento das eventuais ordens judiciais para despejo, desocupação ou reintegração de posse expedidos em face das chamadas ocupações “Dandara”, localizada na região da Nova Pampulha, e “Camilo Torres”, localizada na região do Distrito Industrial do Vale do Jatobá, seja precedido do cumprimento da Lei Estadual n. 13.604, que dispõe que os processos de desocupação compulsória sejam mediados por comissão tripartite formada por membros indicados pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, assegurando-se a observância da Constituição Federal e do ordenamento jurídico vigente, notadamente no que se refere à necessidade de assegurar-se o reassentamento das famílias em local adequado à sua situação de vulnerabilidade social;



2. que seja buscado o estabelecimento de condições para tentativa de mediação entre as partes em litígio, com a participação de representantes dos Poderes Públicos Estadual, Municipal e Federal, do Ministério Público e da Defensoria Pública, e deste Conselho Estadual, estabelecendo-se espaço adequado para a construção de solução pacífica para a grave situação apresentada, inclusive mediante tentativa de mediação e/ou conciliação em segunda instância com a participação direta do Poder Judiciário.



Belo Horizonte, 16 de dezembro de 2010.

domingo, 12 de dezembro de 2010

OBRIGADO, LULA

Frei Betto


Nunca antes na história deste país um metalúrgico havia ocupado a
presidência da República. Quantos temores e terrores a cada vez que
você se apresentava como candidato! Diziam que o PT, a ferro e fogo,
implantaria o socialismo no Brasil.

Quanta esperança refletida na euforia que contaminou a Esplanada dos
Ministérios no dia de sua posse! Decorridos oito anos, eis que a
aprovação de seu governo alcança o admirável índice de 84% que o
consideram ótimo e bom. Apenas 3% o reprovam.

O Brasil mudou para melhor. Cerca de 20 milhões de pessoas, graças ao
Bolsa Família e outros programas sociais, saíram da miséria, e 30
milhões ingressaram na classe média. Ainda temos outros 30 milhões
sobrevivendo sob o espectro da fome e quem sabe o Fome Zero, com seu
caráter emancipatório, a tivesse erradicado se o seu governo não o
trocasse pelo Bolsa Família, de caráter compensatório, e que até hoje
não encontrou a porta de saída para as famílias beneficiárias.

Você resgatou o papel do Estado como indutor do desenvolvimento e,
através dos programas sociais e da Previdência, promoveu a
distribuição de renda que aqueceu o mercado interno de consumo. O
BNDES tornou as grandes empresas brasileiras competitivas no mercado
internacional. Tomara que no governo Dilma seja possível destinar
recursos também a empreedimentos de pequeno e médio porte e favorecer
nossas pesquisas em ciência e tecnologia.

Enquanto os países metropolitanos, afetados pela crise financeira,
enxugam a liquidez do mercado e travam o aumento de salários, você
ampliou o acesso ao crédito (R$ 1 trilhão disponíveis), aumentou o
salário mínimo acima da inflação, manteve sob controle os preços da
cesta básica e desonerou eletrodomésticos e carros. Hoje, 72% dos
domicílios brasileiros possuem geladeira, televisor, fogão, máquina
de lavar, embora 52% ainda careçam de saneamento básico.

Seu governo multiplicou o emprego formal, sobretudo no Nordeste, cuja
perfil social sofre substancial mudança para melhor. Hoje, numa
população de 190 milhões, 105 milhões são trabalhadores, dos quais
59,6% possuem carteira assinada. É verdade que, a muitos, falta
melhor qualificação profissional. Contudo, avançou-se: 43,1%
completaram o ensino médio e 11,1% o ensino superior.

Na política externa o Brasil afirmou-se como soberano e independente,
livrando-se da órbita usamericana, rechaçando a ALCA proposta pela
Casa Branca, apoiando a UNASUL e empenhando-se na unidade
latino-americana e caribenha. Graças à sua vontade política, nosso
país mira com simpatia a ascensão de novos governantes
democráticos-populares na América Latina; condena o bloqueio dos EUA
a Cuba e defende a autodeterminação deste país; investe em países da
África; estreita relações com o mundo árabe; e denuncia a hipocrisia
de se querer impedir o acesso do Irã ao urânio enriquecido, enquanto
países vizinhos a ele, como Israel, dispõem de artefatos nucleares.

Seu governo, Lula, incutiu autoestima no povo brasileiro e, hoje, é
admirado em todo o mundo. Poderia ter sido melhor se houvesse
realizado reformas estruturais, como a agrária, a política e a
tributária; determinado a abertura dos arquivos da ditadura em poder
das Forças Armadas; duplicado o investimento em educação, saúde e
cultura.

Nunca antes na história deste país um governo respaldou sua Polícia
Federal para levar à cadeia dois governadores; prender políticos e
empresários corruptos; combater com rigor o narcotráfico. Pena que o
Plano Nacional dos Direitos Humanos 3 – quase um plágio dos 1 e 2 do
governo FHC –tenha sido escanteado por preconceitos e covardia de
ministros que o aprovaram previamente e não tiveram a honradez de
defendê-lo quando escutaram protestos de vozes conservadoras.

Espero que o governo Dilma complemente o que faltou ao seu: a
federalização dos crimes contra os direitos humanos; uma agenda mais
agressiva em defesa da preservação ambiental, em especial da Amazônia;
a melhoria do nosso sistema de saúde, tão deficiente que obriga 40
milhões de brasileiros a dependerem de planos de empresas privadas; a
reforma das redes de ensino público municipais e estaduais.

Seu governo ousou criar, no ensino superior, o sistema de cotas; o
ProUni e o ENEM; a ampliação do número de escolas técnicas; maior
atenção às universidades federais. Mas é preciso que o governo Dilma
cumpra o preceito constitucional de investir 8% do PIB em educação.

Obrigado, Lula, por jamais criminalizar movimentos sociais; preservar
áreas indígenas como Raposa Serra do Sol; trazer Luz para Todos. Sim,
sei que você não fez mais do que a obrigação. Para isso foi eleito.
Mas considerando os demais governantes de nossa história republicana,
tão reféns da elite e com nojo do “cheiro de povo”, como um deles
confessou, há que reconhecer os avanços e méritos de sua
administração.

Deus permita que, o quanto antes, você consiga desencarnar-se da
presidência e voltar a ser um cidadão militante em prol do Brasil e
de um mundo melhor.



Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do Poder” (Rocco), entre
outros livros. www.freibetto.org -
twitter:@freibetto

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

- 10/12/2010
Fonte: Agência Senado
Link: http://www.senado.gov.br


O senador José Nery (PSOL-PA) denunciou em Plenário, nesta quinta-feira (9), dois casos de trabalho escravo em fazendas no sul do Pará, localizadas nos municípios de Itupiranga e Brejo Grande do Araguaia.

De acordo com Nery, as duas propriedades rurais mantinham 35 trabalhadores em condições análogas à escravidão, dispondo alguns deles apenas de uma mangueira como abrigo.

Os empregados na Fazenda de Itupiranga, segundo ele, foram contratados, numa jornada diária de 8 horas, para fazer o desmatamento de área destinada a criação de gado. Eles não possuíam, informou, qualquer tipo de equipamento de proteção individual (EPIs), como botas, chapéus, óculos, luvas e roupas especiais para desenvolverem a atividade.

Na outra propriedade, no município de Brejo Grande do Araguaia, três trabalhadores foram encontrados morando num barraco de palha sem quaisquer equipamentos sanitários.

- Os fatos que relato aqui, reportagem da ONG Repórter Brasil, especializada em denunciar fatos de violência contra trabalhadores rurais em condições análogas às de escravo ou de trabalhador na área urbana, demonstram o quanto são urgentes as providências, as medidas que efetivamente possam coibir a prática de trabalho escravo no Brasil - disse

Belo Monte no ENEM: o errado vira certo, artigo de Rodolfo Salm

"De forma geral, a marca maior desta passagem do PT pela presidência da República será o descaso com o meio ambiente. Mas Belo Monte não será apenas um exemplo entre muitos outros. Mais que a maior obra do PAC, seria aquela com os impactos mais amplos e profundos, com conseqüências continentais e repercussão mundial". O comentário é de Rodolfo Salm, professor da Universidade Federal do Pará - UFPA e faz parte do Painel de Especialistas para a Avaliação Independente dos Estudos de Impacto Ambiental de Belo Monte, em artigo publicado no sítio EcoDebate, 08-12-2010.

Eis o artigo.

Leciono na faculdade de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará, em Altamira, no Xingu, onde se pretende construir a hidrelétrica de Belo Monte. Apesar de os meus futuros alunos estarem sendo selecionados pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), eu vinha acompanhando apenas por alto os vários problemas das provas.
Seguiria desta forma se não me contassem, por acaso, de uma menina daqui que estava “inconformada” com uma questão da prova, sobre Belo Monte, que ela estava convicta de que havia acertado apesar do gabarito oficial apontar o contrário. E ainda teve que ouvir chistes dos amigos por não ter acertado a única pergunta que se referia a algo diretamente ligado à sua região.

Trata-se da questão 15 da prova de “Ciências Humanas e suas Tecnologias”, que tem a seguinte introdução (os grifos são meus):

“A usina hidrelétrica de Belo Monte será construída no rio Xingu, no Pará (ainda espero que não). A usina será a terceira maior do mundo e a maior totalmente brasileira, com capacidade de 11,2 mil megawatts (informação equivocada: esse seria o valor do pico das chuvas, a produção média anual seria de menos da metade disso). Os índios do Xingu tomam a paisagem com seus cocares, arcos e flechas. Em Altamira, no Pará, agricultores fecharam estradas de uma região que será inundada pelas águas da usina“.

Então, pergunta-se: “Os impasses, resistências e desafios associados à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte estão associados…”

a. Ao potencial hidrelétrico dos rios do norte e nordeste quando comparados às bacias hidrográficas das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país.
b. À necessidade de equilibrar e compatibilizar o investimento no crescimento do país com os esforços para a conservação ambiental.
c. À grande quantidade de recursos disponíveis para as obras e à escassez dos recursos direcionados para o pagamento pela desapropriação das terras.
d. Ao direito histórico dos indígenas à posse dessas terras e à ausência de reconhecimento desse direito por parte das empreiteiras.
e. Ao aproveitamento da mão-de-obra especializada disponível na região Norte e o interesse das construtoras na vinda de profissionais do Sudeste do país.

É impressionante a constatação de que todas as alternativas estão certas! Com a possível exceção daquela que é considerada correta pelos examinadores…

A estudante secundarista escolhera a opção “d” (ausência de reconhecimento dos direitos históricos indígenas pelas empreiteiras) e não se conformava de ter “errado”, pois tinha visto os protestos dos índios na cidade e seu enfrentamento com os representantes das empreiteiras. Teoricamente, as empreiteiras só entram na jogada depois que o governo e o IBAMA liberam e dão as autorizações necessárias.

Poderia se dizer que houve desrespeito, sem dúvida, ao direito dos indígenas, mas que esse desrespeito veio de quem tomou a iniciativa de construir e a quem dá a autorização ambiental para construir. Mas sabemos que este é um jogo de cartas marcadas em que as empreiteiras é que ditam as regras, através, por exemplo, de fartas doações de campanha. O que explica, por exemplo, os recursos muito superiores da campanha presidencial do PT, se comparados com os da oposição.

A opção “a” (do potencial hidrelétrico das várias regiões) tem uma pegadinha: o “grande potencial inexplorado” do Brasil está concentrado na região Norte e não no Nordeste. Ainda assim, se colocarmos as duas regiões juntas em um lado da balança contra o resto do país do outro, ela não deixa de estar certa. Isso explica parte da resistência à barragem, sim, pois alguns dos opositores à obra não se conformam com este papel de exportador de energia barata para a nossa região, a favor do Sul e Sudeste desenvolvidos.

A precariedade do processo de desapropriação de terras e das compensações ambientais que não estão sendo cumpridas confirma a veracidade da opção “c”. Sem um estudo mais transparente e detalhado não é possível dizer com certeza se há realmente “escassez de recursos direcionados para o pagamento pela desapropriação das terras”. Mas porque este trabalho não começou há tempos, de forma séria e sistemática, bem antes da data que se pretende para o início das obras?

Finalmente, o “aproveitamento da mão-de-obra especializada disponível na região Norte” também é problemático e não há dúvidas de que há grandes interesses por parte das empreiteiras em vários negócios associados com a vinda de profissionais do Sudeste do país. Isso também está “associado aos impasses, resistências e desafios associados à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte”. Afinal, parte dos que se dizem contra a obra, o são, pois sabem que, com a formação que têm, não teriam lugar nessa empreitada.

A opção oficialmente certa é a cínica: os impasses, resistências e desafios associados à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte estariam relacionados “à necessidade de equilibrar e compatibilizar o investimento no crescimento do país com os esforços para a conservação ambiental”. Seria possível “equilibrar” sem “compatibilizar”? E o contrário? O mau uso do português é típico da estratégia de enrolação. E, afinal, o que é “compatibilizar o crescimento com a conservação”? Pode ser tudo e coisa nenhuma.

Os estudantes que marcaram como corretas as opções mais claras e diretas sobre o potencial hidrelétrico dos rios, o desequilíbrio no destino dos recursos disponíveis com prejuízo para as “compensações”, os direitos indígenas que estão sendo violados e a mão-de-obra local que não está preparada para ocupar posições importantes na construção, não pontuaram na questão 15 desta prova do ENEM. E ali foram selecionados aqueles que desde cedo carregam uma certa predileção pela linguagem ambígua sub-reptícia do discurso do “desenvolvimento sustentável”, rica em neologismos, mas pobre em significados concretos. Perdem as nossas universidades.

Não sei. Pode até ser que consigam nos enfiar essa hidrelétrica garganta abaixo, mas não há como manter a mentira para sempre. Feita em nome dos interesses das grandes empreiteiras, Belo Monte seria um desastre colossal para o Xingu, a floresta Amazônica, os índios e povo do Norte e do Brasil em geral. A não ser que ainda consigamos nos contrapor à força avassaladora de tais interesses, essa tragédia será para as gerações futuras a marca maior dos governos Lula e Dilma.

De forma geral, a marca maior desta passagem do PT pela presidência da República será o descaso com o meio ambiente. Mas Belo Monte não será apenas um exemplo entre muitos outros. Mais que a maior obra do PAC, seria aquela com os impactos mais amplos e profundos, com conseqüências continentais e repercussão mundial. Mais que as hidrelétricas do Madeira, dada a vulnerabilidade das florestas da Amazônia Oriental, e a importância do Xingu como último grande rio do planeta em ótimo estado de conservação e ocupado majoritariamente por povos indígenas. Mais do que a transposição do rio São Francisco, que não causará mudanças geopolíticas ecologicamente tão relevantes como a imensa migração humana que se espera para esta região da Amazônia, que geraria um imenso incremento nos desmatamentos.

Tentando acima de tudo reinventar a História, considerando o certo errado e o errado certo, a incompetência do vazamento de provas e os erros de impressão, como a numeração invertida das questões no quadro de respostas, são inevitáveis conseqüências.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Igreja de Santa Teresa em BH: Pré-vestibular quase que de graça!

O pré-vestibular da Igreja de Santa Teresa está na iminência de encerrar suas atividades por falta de alunos!!
Para que essa louvável iniciativa de voluntários se mantenha, é essencial que novos alunos se matriculem e frequentem as aulas.
Como sabem, o êxodo escolar, que esvazia as salas de aula de todo o nosso país, é grande e se faz sentir também nesse curso pré-vestibular, que funciona à noite e cujo público é de pessoas que trabalham de dia.
Muitas vezes o cansaço vence e os alunos desistem.
Outras vezes o aluno perde o emprego e não tem como pagar a mensalidade.
O sonho do curso universitário é oferecido a qualquer pessoa por um valor muito reduzido, quase simbólico.
O curso tem acompanhamento pedagógico, com avaliação didática e programática por voluntários da comunidade de Santa Teresa.
Os professores são simbolicamente remunerados e outros abrem mão da remuneração por acreditarem no amor maior de lecionar e todos ajudam na formação do futuro universitário.
As aulas começaram em março e mantém o horário de 19:20h às 22:00h, no Salão Paroquial da Igreja de Santa Teresa.
A inscrição deve ser feita no mesmo local, com as coordenadoras, de 2ª a 6ª feira, durante o período das aulas, pessoalmente.
O candidato preenche uma ficha de inscrição e paga a taxa de matrícula no valor de R$ 10,00 - a mensalidade também é de R$ 45,00.
A Igreja de Santa Teresa fica na rua Mármore, Praça de Santa Teresa, em Santa Teresa, de fácil acesso.

Peço a todos que divulguem.Coordenação do Curso Pré-vestibular:

Sra. Piedade - 3461-4239

Paróquia de Santa Tereza
Praça Duque de Caxias, 200 - Santa Tereza,
Belo Horizonte - MG, 31010-230
(0xx)31 3461-9648

Ataque aos quilombolas de BH

Belo Horizonte, dezembro de 2010

Prezados,

O “Quilombo dos Luízes”, situado no bairro Grajaú, região Oeste de Belo Horizonte, vem respeitosamente pedir sua atenção e colaboração mediante o exposto a seguir:

Há no Brasil, hoje, cerca de três mil comunidades quilombolas. De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), as áreas remanescentes de quilombos se encontram tanto em regiões rurais como também em centros urbanos.. Contudo, as comunidades localizadas nas grandes cidades estão correndo risco de desaparecerem. A especulação imobiliária e o tempo despendido no processo de emissão do título de propriedade são fatores determinantes para a maior ou menor possibilidade de sobrevivência do quilombo. Após decisão, em 2ª instância, do Judiciário Federal em Minas Gerais, o “Quilombo dos Luízes” viu suas chances diminuírem ainda mais..

Estamos lutando há pelo menos 100 anos para proteger não só o nosso território mas também nossa cultura, costumes e valores. Depois de conseguirmos, em 2010, na Justiça Federal, por meio da atuação da Defensoria Pública da União, liminar para paralisar obras de construtora em área pertencente à nossa comunidade, a mesma foi suspensa em instância superior. Mesmo tendo em mãos recente parecer do Incra declarando que os lotes atribuídos ao empreendimento estão dentro do território quilombola, o desembargador acatou a alegação do empreendedor que clamou pelo direito de propriedade. Outro processo está em andamento, pois a expansão imobiliária já reduziu aproximadamente 60% do terreno original.

A Prefeitura de Belo Horizonte continua expedindo alvarás de construção porque a regularização fundiária do território caminha a passos lentos. Embora o título de propriedade não tenha sido emitido pelo Incra, a Constituição Federal de 1988 já nos garantiu este direito: o art.68 do ADCT assegura que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida à propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.



Comunidade dos Luízes

Segundo a definição do Incra, “As comunidades quilombolas são grupos étnicos predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias”.

Nossa história começa antes mesmo da inauguração da então capital mineira, ao final do Séc. XIX, quando abolida a escravidão. A saga dos Luízes teve seu início com as uniões entre o ex-escravo Nicolau e Felicíssima. Desta união, nasceu Vitalino, que, por sua vez, casou-se com Maria Luiza, esta, filha de Anna Apolinária, escrava liberta, com origem em Nova Lima e de Manoel Luiz Moreira.

Nicolau recebeu uma gleba de terras à beira do Córrego Piteiras, hoje, Av. Silva Lobo, como compensação por trabalhos escravos.. O primeiro registro de transferência das terras que se tem, data de 1895/1896, quando teria sido transmitido 6050 m2 ou 6950 m2. Porém, no Relatório Antropológico de Caracterização, Histórica, Econômica e Sócio-cultural do Quilombo dod Luízes “há referências consistentes sobre a existência de um território original, margeando todo o córrego, denominado Fazenda Piteiras, ocupado pelos filhos de Nicolau, com extensão de aproximadamente 18.000 m2”.



Relatório Técnico Antropológico

Em 2005, o Incra deu início ao processo de regularização fundiária de nossa comunidade. Um dos pilares desse procedimento é o Relatório Antropológico de Caracterização, Histórica, Econômica e Sócio-cultural realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais.

O documento concluiu que a área caracteriza-se, de fato, como uma comunidade quilombola e alerta: “(...) Este território está marcado, como se verá, por intensa competição espacial com outros segmentos sociais, agravada nas últimas décadas com perdas importantes de espaços vitais e tradicionais, obrigando o grupo a assumir defesas contínuas, de todo tipo de posse dos limites originais do espaço, muitas vezes em vão ou com pouco sucesso, dado o considerável poder político e econômico dos novos ocupantes”.

Para que este quilombo não desapareça, peço que se mobilizem e partilhem conosco esta luta que não é só nossa, pois se trata da preservação de um patrimônio histórico e cultural.

Atenciosamente,

Quilombolas da Comunidade dos Luízes



MIRIAM APRIGIO PEREIRA / 31-92873606
Historiadora e Quilombola da Comunidade dos Luízes
Membro do Núcleo de Estudos em Populações Quilombolas e Tradicionais da UFMG (NUQ/UFMG)

Diretora de Política, Educação, Comunicação e Formação da Federação das Comunidades Quilombolas de MG: N'GOLO

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

5º SHOW DOS DIREITOS IGUAIS NA DIFERENÇA

Belo Horizonte (MG) será a capital da música e dos Direitos Humanos no dia 12 de dezembro, a partir das 17h30, na praça da Estação, com a realização do 5º show dos Direitos Humanos: Iguais na Diferença. Sob o comando de Antonio Nóbrega, um time estelar fará uma grande festa para celebrar os 62 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 10 de dezembro de 1948. E um show com essa temática não poderia faltar a personalidade mais emblemática de Minas Gerais, Milton Nascimento, que será homenageado pela importância do papel desempenhado pelo cantor que fez uso de suas músicas para protestar contra a ditadura, se transformando num ícone da música brasileira. O show dos Direitos Humanos é uma realização da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e Ministério da Cultura (MinC) com patrocínio da Petrobrás e da Eletrobrás.
“A nossa proposta com essa celebração é validar a arte como importante canal para a promoção dos Direitos Humanos, que engloba também o Direito à Cultura”, afirma o ministro dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi. Na avaliação dele, a cultura, a arte e a música sempre tiveram e têm papel fundamental para a promoção desses direitos no Brasil e no mundo e o show comemora essa parceria histórica. “Direitos Humanos são a defesa da vida e a idéia do show é celebrar a vida, as diferenças e o direito a igualdade”, afirma Vannuchi.
Doze artistas já confirmaram presença nesta comemoração pelos direitos humanos: Arnaldo Antunes, Chico César, Elba Ramalho, Elza Soares, Fernanda Takai, Lenine, Luiz Melodia, Margareth Menezes, Sérgio Ricardo, Lô Borges e o próprio homenageado, Milton Nascimento.
Quem também virá especialmente para a ocasião é o Pablo Milanés, cantor cubano e um dos maiores nomes da música latina, tendo já gravado 26 discos. Cada canção de Milanés é como uma poesia, de alguém atento e sensível ao mundo que o rodeia.
Nóbrega conta que a seleção de músicos foi “fiel ao espírito da Semana”. “Tentei fazer uma radiografia da heterogeneidade da música brasileira”, explica o multiartista. Há diferentes ritmos e estilos entre esses músicos, mas todos têm trabalhos muito interessantes e representam bem a diversidade musical do Brasil”.
“Faremos um show bem brasileiro, com artistas comprometidos com a música brasileira”, afirma Antônio Nóbrega. Segundo ele, a idéia é de celebração, união, confraternização.
O show dos direitos humanos acontece numa data importante para a cidade de Belo Horizonte: o aniversário de 113 anos da cidade. Com o show, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República valida a educação e a cultura como direitos humanos previstos na Declaração Universal, no Protocolo de São Salvador e na Constituição Brasileira de 1988.
História do show - De acordo com os registros históricos, o Show dos Direitos Humanos aconteceu pela primeira vez no dia 10 de dezembro de 1973, durante o regime militar, em homenagem aos 25 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. A iniciativa do show foi do cantor e compositor Jards Macalé com a participação de Milton Nascimento, Chico Buarque, Edu Lobo, Jorge Mautner, Dominguinhos, Gal Costa, Paulinho da Viola, Raul Seixas, dentre outras.
Em 2006, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República realizou o primeiro show dos direitos humanos: iguais na diferença na cidade do Rio de Janeiro. Nos anos seguintes o show passou pelas cidades de Salvador, Brasília, Recife e Fortaleza.
Os Direitos Culturais são parte integrante dos direitos humanos e estão indicados no artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), e nos artigos 13 e 15 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966). Assim, todas as pessoas devem poder participar da vida cultural de sua escolha e exercer suas próprias práticas culturais.
O Show dos Direitos Humanos 2010 tem apoio da Feira Música Brasil.
5ª show dos Direitos Humanos – Iguais na Diferença
Data: 12 de dezembro de 2010
Horário: A partir das 17h30
Entrada: Gratuita
Local: Praça da Estação - Centro de Belo Horizonte (MG)
Informações: www.direitoshumanos.gov.br

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Todos os dias o povo come veneno.

Quem são os responsáveis?



João Pedro Stedile (*)



O Brasil se transformou desde 2007, no maior consumidor mundial de venenos agrícolas. E na ultima safra as empresas produtoras venderam nada menos do que um bilhão de litros de venenos agrícolas. Isso representa uma media anual de 6 litros por pessoa ou 150 litros por hectare cultivado. Uma vergonha. Um indicador incomparável com a situação de nenhum outro país ou agricultura.



Há um oligopólio de produção por parte de algumas empresas transnacionais que controlam toda a produção e estimulam seu uso, como a Bayer, a Basf, Syngenta, Monsanto, Du Pont, Shell química, etc



O Brasil possui a terceira maior frota mundial de aviões de pulverização agrícola. Somente esse ano foram treinados 716 novos pilotos. E a pulverização aérea é a mais contaminadora e comprometedora para toda a população.



Há diversos produtos sendo usados no Brasil que já estão proibidos nos paises de suas matrizes. A ANVISA conseguiu proibir o uso de um determinado veneno agrícola. Mas as empresas ganharam uma liminar no “neutral poder judiciário” brasileiro, que autorizou a retirada durante o prazo de três anos... e quem será o responsável pelas conseqüências do uso durante esses três anos? Na minha opinião é esse Juiz irresponsável que autorizou na verdade as empresas desovarem seus estoques.



Os fazendeiros do agronegóio usam e abusam dos venenos, como única forma que tem de manter sua matriz na base do monocultivo e sem usar mão-de-obra. Um dos venenos mais usados é o secante, que é aplicado no final da safra para matar as próprias plantas e assim eles podem colher com as maquinas num mesmo período. Pois bem esse veneno secante vai para atmosfera e depois retorna com a chuva, democraticamente atingindo toda população inclusive das cidades vizinhas.



O DR.Vanderley Pignati da Universidade Federal do Mato Grosso tem várias pesquisas comprovando o aumento de aborto, e outras conseqüências na população que vive no ambiente dominado pelos venenos da soja.



Diversos pesquisadores do Instituto Nacional do Câncer e da Universidade federal do Ceara já comprovaram o aumento do câncer, na população brasileira, conseqüência do aumento do uso de agrotóxicos.



A ANVISA – responsável pela vigilância sanitária de nosso país, detectou e destruiu mais de 500 mil litros de venenos adulterados,somente esse ano, produzido por grandes empresas transnacionais. . Ou seja, alem de aumentar o uso do veneno, eles falsificavam a formula autorizada, para deixar o veneno mais potente, e assim o agricultor se iludir ainda mais.



O Dr. Nascimento Sakano, consultor de saúde, da insuspeita revista CARAS escreveu em sua coluna, de que ocorrem anualmente ao redor de 20 mil casos de câncer de estomago no Brasil, a maioria conseqüente dos alimentos contaminados, e destes 12 mil vão a óbito.



Tudo isso vem acontecendo todos os dias. E ninguém diz nada. Talvez pelo conluio que existe das grandes empresas com o monopólio dos meios de comunicação. Ao contrário, a propaganda sistemática das empresas fabricantes que tem lucros astronômicos é de que, é impossível produzir sem venenos. Uma grande mentira. A humanidade se reproduziu ao longo de 10 milhões de anos, sem usar venenos. Estamos usando veneno, apenas depois da segunda guerra mundial, para cá, como uma adequação das fabricas de bombas químicas agora, para matar os vegetais e animais. Assim, o poder da Monsanto começou fabricando o Napalm e o agente laranja, usado largamente no Vietname. E agora suas fabricas produzem o glifosato. Que mata ervas, pequenos animais, contamina as águas e vai parar no seu estomago.



Esperamos que na próxima legislatura, com parlamentares mais progressistas e com novo governo, nos estados e a nível federal, consigamos pressão social suficiente, para proibir certos venenos, proibir o uso de aviação agrícola, proibir qualquer propaganda de veneno e responsabilizar as empresas por todas as conseqüências no meio ambiente e na saúde da população.



(*)João pedro stedile, membro da via campesina Brasil.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Sobre a transposição do Rio São Francisco

Bispos do Regional Nordeste 2, após sua visita às obras de transposição de águas do Rio São Francisco

“Dar-vos-ei pastores de acordo com o meu projeto.” (Jr 3,15)

Na condição de Bispos do Regional Nordeste 2 da CNBB, sentimos a ncessidade de visitar, com um olhar pastoral, as obras de transposição de águas do Rio São Francisco, primeiramente, para conhecermos, de perto, esse empreendimento de grande magnitude que já está mudando o rosto de nossa Região; sabemos que essas obras haverão de incidir, profundamente, na vida de milhões de nossos irmãos e irmãs nordestinos. Motivou-nos também a vontade de exercer, como cidadãos, uma ação de controle social na execução dessa obraa, construída com o dinheiro de todos os contribuintes do País. Constituiu razão de nossa visita o desejo ouvir o povo das comunidades, onde passam os canais, para sentir, de viva voz, como vive este tempo de mudança.

Nos dias 09 e 10 de novembro de 2010, visitamos os canteiros de obras dos Eixos Leste e Norte da transposição de águas do Rio São Francisco, encontrando-nos com gestores e técnicos governamentais e líderes de algumas das comunidades atingidas pelas obras.

No dia 09 de novembro, fomos acolhidos no canteiro de obras, situado perto da tomada d’água do Eixo Leste, pelo próprio Ministro da Integração Nacional, Dr. João Santana, o qual nos explicou, com muita propriedade e competência, o valor e o alcance do projeto. No dia seguinte, 10, acompanhados por técnicos do Projeto, visitamos as obras do Eixo Norte, em Cabrobó e em Salgueiro. Concluímos o dia encontrando lideranças de algumas das comunidades atingidas pelas obras que nos expuseram suas esperanças, dúvidas e preocupações.

A visita nos ajudou a perceber algumas faces dessa realidade que queremos partilhar:

- O Projeto é uma obra enorme, talvez a maior já realizada no Nordeste. Questionada por segmentos da sociedade, em sua concepção e durante a fase de audiências públicas e de obtenção de autorização de órgãos técnicos, a obra está em execução, tornando-se difícil pensar em sua paralisação.

- O impacto dessa obra já é grande e, quando terminada, deverá ser maior ainda. O “rasgo” feito na caatinga, por onde passam os canais no Eixo Leste, num total de 220 km, e no Eixo Norte, numa extensão de 426 km, é bastante significativo: 200 metros de largura.

- Constatamos muito desperdício da madeira extraída na área dos canais, que está se perdendo porque, em razão de questões burocráticas, o IBAMA não definiu, nem autorizou a sua utilização, legalmente.

- O governo está investindo muitos recursos: não falta dinheiro para a obra.

- A indenização das terras dos moradores das comunidades atingidas, frequentemente, é irrisória e demorada; a maioria dos pequenos proprietários não possui título legal das terras e a legalização, em Pernambuco, está se processando muito devagar.

- Percebemos que há pouca sinergia entre vários departamentos do governo, tanto federal como estaduais, com impasses sérios na resolução dos problemas concretos que uma obra deste porte levanta, prejudicando quase sempre os mais fracos, a exemplo de pessoas que ainda não receberam as indenizações, por problemas de natureza burocrática.

- As comunidades indígenas, de modo especial, queixam-se de não ter havido um debate sério a respeito da obra e de não terem sido considerados os seus direitos e reivindicações.

- Para os moradores que ficaram com suas terras divididas, existem dificuldades reais para atravessamento dos canais, considerando as distâncias dos locais onde serão construidas as pontes.

- Todos os moradores das localidades próximas às obras da Transposição vivem na incerteza de como e quando poderão retomar seu ritmo de vida, depois da conclusão das obras, ou depois de terem sido reassentados.

- Os trabalhos de revitalização são praticamente inexistentes no trecho do Rio São Francisco de onde saem os dois Eixos da Transposição. Embora não tenham chegado a todas, os trabalhos de saneamento básico constituem exceção, porque estão sendo realizados em muitas cidades da bacia. Estes trabalhos, porém, deveriam ser melhor fiscalizados, pois existem fortes dúvidas quanto à qualidade e à utilidade das obras realizadas em várias cidades.

- Reconhecemos o beneficio da água destinada, de fato, a quem tem mais carência e precisa de melhor qualidade de vida – populações e rebanhos dos Estados de Pernambuco, Paraiba, Rio Grande do Norte e Ceará.

- Persiste, no entanto, um grande questionamento: além das declarações oficiais, a quem a obra irá beneficiar de verdade? Foi-nos explicado que as águas do canal poderão ser usadas com um sistema de outorga: seria a serviço da agricultura familiar ou do agro-negócio?

- Preocupa-nos, especialmente, a situação dos mais pobres e desamparados, para que não sejam esquecidos ou atropelados por este grandioso Projeto.

- Agradecemos ao Ministério da Integração Nacional, pela atenção, ao acolher-nos, e pela cortesia, ao acompanhar-nos na visita às obras da transposição de águas do São Francisco. Agradecemos aos membros das comunidades que participaram do encontro conosco, pela partilha de sua vida e confiança depositada em nossa missão.

Recife, 24 de novembro de 2010

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Encontro Arquidiocesano / Missão na Vila Sumaré

Irmãos em Cristo,



"Os pobres são os prediletos de Deus, e a eles Jesus dedicou um amor de preferência, que a Igreja deseja imitar. Porque é sobretudo nos pobres, com os quais se identifica, que Jesus quer ser amado (Cfr. Mt 25, 40-45). No rosto dos que sofrem, sob o peso das carências espirituais, afetivas e materiais, a Igreja reconhece o rosto do próprio Cristo. Nos rostos de crianças, golpeadas pela pobreza ainda antes de nascer, crianças abandonadas e muitas vezes exploradas; rostos de jovens desorientados por não encontrarem seu lugar na sociedade, frustrados por falta de capacitação e de emprego; rostos de trabalhadores freqüentemente mal retribuídos ou com dificuldade para se organizarem e defenderem os seus direitos; rostos dos subempregados e desempregados, despedidos por causa das duras exigências das crises econômicas; rostos das mães de família, angustiadas por não terem os meios para sustentar e educar os filhos; rostos dos mendigos e marginalizados; rostos dos anciãos desamparados e esquecidos (Cfr. Puebla, 31-39) Contemplando as imensas multidões deste querido Brasil, que levam em si os traços dolorosos de Cristo, vêm-me ao pensamento as palavras de Jesus: “tudo o que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25, 40). (João Paulo II, Discurso ao moradores da favela do lixão).



Civilização do Amor que é "aquele conjunto de condições morais, civis e econômicas que permite à vida humana uma condição melhor de existência, uma racionalidade plena e feliz destino eterno." (Paulo VI - Discurso de encerramento do Ano Santo, 25/12/1975) A Igreja é a promotora da civilização do amor e essa pressupõe necessariamente a prática da justiça. “O amor aos homens, e em primeiro lugar, ao pobre, no qual a Igreja vê Cristo, concretiza-se na promoção da justiça” (Centesimus Annus, 58).

Nesse mesmo Espírito, o Ministério de Promoção Humana RCC-BH, realizará nos dias 27/28 de Novembro na Vila Sumaré, o Encontro Arquidiocesano. Será um dia de formação e outro de visitas às famílias. Temos o propósito de uma evangelização encarnada com a realidade social, que leve a Luz onde as trevas são muitas. Da nossa primeira experiência de missão nessa Vila, no mês passado, tomamos conhecimento, por exemplo, da “pesada” realidade do tráfico, que chega a ter becos com 40 pessoas na fila para comprar a droga, e envolve até crianças! É tempo de resgatarmos o sentido profundo da palavra Profecia, e assim, com toda vida e força, nos lançarmos na evangelização daqueles que esperam ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus.

Teremos para quem quiser ajudar na organização da Missão, uma reunião no próximo sábado dia 20, às 14 horas no escritório da RCC. (Espírito Santo 1059-4 andar)

Obrigado,

Bruno Cardoso.

Ministério de Promoção Humana RCC-BH

25528175/82083733.

Fiz o propósito de não perder nenhuma ocasião que Deus me oferece para fazer o bem.” (Bem-aventurado Tiago Alberione

Belo Horizonte tem 14 mil famílias em área de risco

Expectativa é de que o decreto de estado de calamidade pública fosse publicado hoje no Diário Oficial do Município


Da Redação - 25/11/2010 - 19:54


Mauricio de Souza

Cerca de 4 mil residências estão sujeitas a deslizamento e 10 mil a inundações

Belo Horizonte tem 14 mil famílias que moram em áreas de risco. Em entrevista a uma emissora de TV, o prefeito Marcio Lacerda revelou que 4 mil estão sujeitas a deslizamentos e 10 mil a inundações.
A vida destas 4 mil famílias poderá melhorar daqui a dois ou três anos, acredita o prefeito. Segundo ele, a prioridade do programa habitacional da prefeitura é alojar essas pessoas em situação de risco. Já as demais famílias terão que ter paciência, já que obras de infraestrutura são mais caras e demoradas.

Depois da enchente da última terça-feira, que deixou um rastro de destruição nas regiões Norte e Nordeste, o prefeito espera o mapeamento da área afetada para decretar estado de calamidade pública. O prazo é de dez dias.

Nesta quinta-feira (25), a expectativa era de que o decreto fosse publicado no Diário Oficial do Município (DOM) de sexta-feira (26) para agilizar a assistência às vítimas. Porém, a assessoria de imprensa da prefeitura informou que a determinação não seria divulgada.

A lista das famílias que receberão ajuda financeira da prefeitura, cujo valor vai varias de R$ 700 a R$ 2 mil, só será feita após o decreto. “Para isso, precisamos delimitar a área, porque não é um estado de emergência genérico, por bairro”, afirmou o prefeito.

Enquanto isso, a PBH auxilia os moradores das regiões Norte e Nordeste, atingidas pela enchente. Já foram cadastradas 532 famílias, que receberam 1.869 colchões, 383 cestas básicas e 1.067 cobertores.

A Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) informou que do dia 1º de julho até quinta-feira, 64 famílias foram removidas das áreas de risco. Oito delas estão em casas alugadas; 19 em casas de parentes; 20 já têm a liberação da Bolsa Moradia; e três estão em abrigos.

Em meados de 2009, o mapeamento da situação de risco geológico das vilas, favelas e conjuntos habitacionais populares constatou que 211 comunidades estavam em situação de deslizamento. O estudo também mostrou que houve redução de 64% no número de edificações de risco alto e muito alto de deslizamento e desabamento, caindo de 10.650 em 2004 para 3.789 em 2009. Desde 2003 não há nenhuma morte registrada.

Mas a enchente de terça-feira fez uma vítima. Edgar Bispo dos Santos, 36 anos, que morava às margens do Córrego do Onça, no Bairro Ouro Minas, morreu afogado após avisar os vizinhos que o rio estava subindo. Ele voltou para casa e foi arrastado pelas águas. Para solucionar o problema deste e outros 81 pontos sujeitos a alagamentos seria necessário aporte de R$ 5 bilhões. Até agora, o prefeito disse ter investido R$ 40 milhões em obras que estão em fase de conclusão.

O mesmo volume de recursos está assegurado para obras que serão iniciadas. Há ainda obras do Governo do Estado em Contagem ,com aporte de R$ 300 milhões.

E as chuvas não vão dar trégua até o final de semana. Segundo o meteorologista do 5º Distrito de Meteorologia, Claudemir de Azevedo, na sexta-feira o tempo deve ficar nublado, com pancadas de chuva na Zonasda Mata, Leste mineiro, Vale do Jequitinhonha e Sul. Nas demais regiões, céu nublado com chuva à tarde. No final de semana, a tendência é de tempo parcialmente nublado em todo o Estado, com chuvas isoladas.

Nesta quinta-feira, Coordenadoria Estadual de Defesa Civil de Minas Gerais (Cedec) emitiu um alerta para a Zona da Mata mineira. Na sexta-feira, há possibilidade de ocorrer chuva na região com intensidade de 30 milímetros. Segundo a Cedec, há risco de deslizamentos. Desde outubro, nove cidades decretaram situação de emergência. No Estado, 1.012 pessoas estão desalojadas, 104 desabrigadas, dez ficaram feridas e uma morreu.

Belo Horizonte tem 14 mil famílias em área de risco

Expectativa é de que o decreto de estado de calamidade pública fosse publicado hoje no Diário Oficial do Município


Da Redação - 25/11/2010 - 19:54


Mauricio de Souza

Cerca de 4 mil residências estão sujeitas a deslizamento e 10 mil a inundações

Belo Horizonte tem 14 mil famílias que moram em áreas de risco. Em entrevista a uma emissora de TV, o prefeito Marcio Lacerda revelou que 4 mil estão sujeitas a deslizamentos e 10 mil a inundações.
A vida destas 4 mil famílias poderá melhorar daqui a dois ou três anos, acredita o prefeito. Segundo ele, a prioridade do programa habitacional da prefeitura é alojar essas pessoas em situação de risco. Já as demais famílias terão que ter paciência, já que obras de infraestrutura são mais caras e demoradas.

Depois da enchente da última terça-feira, que deixou um rastro de destruição nas regiões Norte e Nordeste, o prefeito espera o mapeamento da área afetada para decretar estado de calamidade pública. O prazo é de dez dias.

Nesta quinta-feira (25), a expectativa era de que o decreto fosse publicado no Diário Oficial do Município (DOM) de sexta-feira (26) para agilizar a assistência às vítimas. Porém, a assessoria de imprensa da prefeitura informou que a determinação não seria divulgada.

A lista das famílias que receberão ajuda financeira da prefeitura, cujo valor vai varias de R$ 700 a R$ 2 mil, só será feita após o decreto. “Para isso, precisamos delimitar a área, porque não é um estado de emergência genérico, por bairro”, afirmou o prefeito.

Enquanto isso, a PBH auxilia os moradores das regiões Norte e Nordeste, atingidas pela enchente. Já foram cadastradas 532 famílias, que receberam 1.869 colchões, 383 cestas básicas e 1.067 cobertores.

A Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) informou que do dia 1º de julho até quinta-feira, 64 famílias foram removidas das áreas de risco. Oito delas estão em casas alugadas; 19 em casas de parentes; 20 já têm a liberação da Bolsa Moradia; e três estão em abrigos.

Em meados de 2009, o mapeamento da situação de risco geológico das vilas, favelas e conjuntos habitacionais populares constatou que 211 comunidades estavam em situação de deslizamento. O estudo também mostrou que houve redução de 64% no número de edificações de risco alto e muito alto de deslizamento e desabamento, caindo de 10.650 em 2004 para 3.789 em 2009. Desde 2003 não há nenhuma morte registrada.

Mas a enchente de terça-feira fez uma vítima. Edgar Bispo dos Santos, 36 anos, que morava às margens do Córrego do Onça, no Bairro Ouro Minas, morreu afogado após avisar os vizinhos que o rio estava subindo. Ele voltou para casa e foi arrastado pelas águas. Para solucionar o problema deste e outros 81 pontos sujeitos a alagamentos seria necessário aporte de R$ 5 bilhões. Até agora, o prefeito disse ter investido R$ 40 milhões em obras que estão em fase de conclusão.

O mesmo volume de recursos está assegurado para obras que serão iniciadas. Há ainda obras do Governo do Estado em Contagem ,com aporte de R$ 300 milhões.

E as chuvas não vão dar trégua até o final de semana. Segundo o meteorologista do 5º Distrito de Meteorologia, Claudemir de Azevedo, na sexta-feira o tempo deve ficar nublado, com pancadas de chuva na Zonasda Mata, Leste mineiro, Vale do Jequitinhonha e Sul. Nas demais regiões, céu nublado com chuva à tarde. No final de semana, a tendência é de tempo parcialmente nublado em todo o Estado, com chuvas isoladas.

Nesta quinta-feira, Coordenadoria Estadual de Defesa Civil de Minas Gerais (Cedec) emitiu um alerta para a Zona da Mata mineira. Na sexta-feira, há possibilidade de ocorrer chuva na região com intensidade de 30 milímetros. Segundo a Cedec, há risco de deslizamentos. Desde outubro, nove cidades decretaram situação de emergência. No Estado, 1.012 pessoas estão desalojadas, 104 desabrigadas, dez ficaram feridas e uma morreu.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

No nosso ser há mulheres prostituídas

Alguém extasiado pela beleza e encanto de uma poesia de Adélia Prado, disse a Adélia Prado, que acabava de fazer uma palestra: “Adélia, você é a autora dessa poesia?” A poetisa de Divinópolis divinamente respondeu: “Não. Autora é a humanidade.” Com isso Adélia queria dizer: A inspiração para essa poesia brotou em mim, mas poderia ter brotado em qualquer pessoa do presente ou do passado. Somos filhas e filhos não apenas de nossos pais e mães, mas de nossos avós, bisavós ..., de todos os nossos ancestrais. Fazemos parte de uma única comunidade de vida. Somos elos vivos de uma grande teia da vida.

Com frei Betto, afirmamos: “Cada um de nós tem 15 bilhões de anos! Nosso corpo é tecido de células, que são feitas de moléculas, que se compõem de átomos, que foram fabricados no calor do Big Bang ou no único forno capaz de fundi-los e transmutá-los: o coração das estrelas. Somos todos feitos de matéria estelar. Somos o Universo que se olha com os nossos olhos. Daí a importância de que essa conaturalidade se estenda à solidariedade impelida por nossos gestos de compaixão e amor.”

Prestemos atenção na linhagem de Jesus de Nazaré, o galileu que, por amor extremado testemunhou um jeito humanizador de viver e conviver. Mesmo condenado à pena de morte, por ter consolado pessoas aflitas e incomodado os acomodados, ressuscitou e vive em nós e no nosso meio.

Com saudade do grande biblista do CEBI[2] Eliseu Lopes - que agora vive em plenitude -, partilho com vocês o que ele sabiamente nos ensinou sobre mulheres prostituídas na nossa ascendência. Com Eliseu recordamos: “Jesus tem linhagem. Não é qualquer um. Antes de tudo, sua árvore genealógica em que os nomes são estacas que se alinham ao longo de toda a história do povo da Bíblia, a começar por Abraão, o Pai Abraão. Para o povo da Bíblia, o notável é que as genealogias, no patriarcalismo dominante, só comportavam nomes masculinos, mas no Evangelho de Mateus, figuram cinco nomes de mulheres chamadas de prostitutas, que dignificam a ascendência de Jesus de Nazaré: Tamar, Raab, Rute, a mulher de Urias (Betsabeia) e Maria. São mulheres que ocupam um lugar importante na História do povo da Bíblia. São mulheres que se distinguiram pela coragem, pela fidelidade, pela resistência, pela criatividade e pela astúcia.
Tamar, nora de Judá, ficou viúva e seu cunhado Onan se recusou a cumprir a lei do “levirato”, que dizia que o irmão do morto deveria assumir a viúva para dar-lhe descendência. Fiel à Lei, corajosa, criativa e astuciosa, Tamar disfarçou-se de prostituta para conseguir do sogro o seu direito, precavendo-se, com a exigência de um penhor, contra as inevitáveis conseqüências da gravidez. (Gênesis 38).

Raab também era considerada prostituta. Acolhe na periferia da cidade de Jericó os Sem Terra espiões enviados por Josué, esconde-os para preservá-los do faro canino dos policiais, dá-lhes a fuga com as devidas instruções para escaparem ilesos e declara que o motivo de sua corajosa generosidade é sua fidelidade ao Deus de Israel. Na hora de partilhar a terra, a família de Raab ganhou um lote. Assim, a aliança dos pobres do campo com os pobres da cidade começou com uma mulher prostituída, Raab. (cf. Josué 2). A Bíblia faz questão de dizer que Jefté, grande juiz no meio do povo, era filho de uma prostituta. (Juízes 11,1).

Rute é a heroína do romance com seu nome. Teve a coragem de deixar seu povo para acompanhar a sogra Noemi, um comovente testemunho de fidelidade à amiga. Teve a astúcia de conquistar as boas graças de Booz. Note-se que a história de Rute pertence à literatura de resistência à restauração implantada pelo sacerdote Esdras. Com Rute se privilegia uma estrangeira com a condição de bisavó de Davi. (Rute 4,18-23).

A beleza de Betsabeia, mulher de Urias, enlouqueceu o rei Davi. Ela teve um papel saliente na sucessão de Davi e graças a ela é que o trono foi ocupado pelo seu filho Salomão. O simples fato de ser mãe de Salomão e a coragem com que enfrentou as intrigas da corte em um momento mais do que crítico, a consagram. (I Reis 1).

Enfim Maria, a mais jovem, a mais fiel, a mais corajosa, a mais lutadora de todas. A única não estrangeira, provavelmente era da estirpe de Davi, pois seu noivado com José supõe laços de parentesco. A mais jovem, talvez ainda quase adolescente, precocemente madura e lúcida. Ficou grávida ainda solteira. Teve muita coragem para enfrentar a inevitável maledicência do povo da pequena cidade de Nazaré. Com o progresso da gestação que se tornou visível, José mergulhou na angústia e caiu em um dramático dilema: denunciá-la para que fosse punida com os rigores da Lei ou abandoná-la. Ia optar pela Segunda alternativa, quando um anjo do Deus da vida lhe apareceu em sonho e o tranqüilizou com a revelação do mistério. (Mt 1,18-25).” Jesus de Nazaré é descendente de Tamar, Raab, Rute, a mulher de Urias (Betsabeia) e Maria, mulheres consideradas impuras, mas muito humanas.

“A maior tristeza é a discriminação. Como você vai falar: sou prostituta.”, desabafam muitas mulheres que batalham. Jesus e Maria também foram discriminados. Por isso também o Evangelho de Mateus fez questão de mostrar a presença de cinco mulheres na história de Jesus. Mesmo tachadas por muitos como prostitutas, o povo da Bíblia viu nelas coragem, criatividade, sensatez, audácia, liberdade, disposição para a luta, muita humanidade... Isso levou Jesus a asseverar: “As prostitutas precederão vocês no reino dos céus.” (Mateus 21,37).

Enfim, como Tamar, Raab, Rute, a mulher de Urias (Betsabeia) e Maria há tantas mulheres que batalham, são amadas pelo Deus da vida e não podem ser discriminadas. Devem ser respeitadas na sua dignidade humana.



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[1] Frei carmelita, mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; professor de Teologia Bíblica; assessor da CPT, SAB, CEBI e Via Campesina; e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br – www.gilvander.org.br – www.twitter.com/gilvanderluis



[2] Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos. www.cebi.org.br

Amiga/ cf. abaixo, ou em anexo ou ainda em www.gilvander.org.br , mais um pequeno texto: "", de frei Gilvander Moreira[1]


(Texto publicado no Jornal Grito Mulher, da Pastoral da Mulher, Belo Horizonte, MG, Ano XIX, Ed. n. 114, novembro de 2010, p. 6.)

Audiencia Pública na Assembléia Legislativa

O Parque Estadual da Serra Negra, com área de 13.654,31 hectares, situado no município de Itamarandiba/MG, foi criado pelo governo do Estado em 22/09/1998, através do decreto nº 39.907, assinado pelo então governador Eduardo Azeredo.
Por muito tempo sequer se sabia da existência da criação do parque, vez que o governo estadual se manteve por quase 09 anos inerte no que tange ao inicio das atividades para a implantação do parque.
No ano de 2007 o Instituto Estadual de Florestas iniciou os trabalhos de identificação e demarcação das propriedades inseridas dentro do perímetro do parque, mapeamento este que precede o serviço de desapropriação.
Naquele mesmo ano foi montada uma equipe de fiscalização do parque, composta por guarda-parques e gerente da unidade de conservação.
Até os dias de hoje foram desapropriados apenas três proprietários, com área aproximada de 5% de todo o parque. Nos exercícios 2009 e 2010 nenhuma propriedade foi desapropriada.
Foram identificadas aproximadamente 150 propriedades inseridas dentro da unidade de conservação, onde mora uma comunidade aproximada de 600 pessoas.
. E inúmeros transtornos têm passado as pessoas que possuem terras na Serra Negra, tendo em vista a morosidade do processo de desapropriação, bem assim as limitações excessivas que lhes são impostas pelas entidades governamentais.
Ressalte-se que estamos tratando de pessoas que vivem na zona rural do município de Itamarandiba, no vale do Jequitinhonha, e que suas atividades são todas (ou eram) voltadas à lavoura de subsistência.
A estes carentes lavradores foi sendo gradativamente cerceado o direito ao plantio, de criar gado, de colher suas plantações de maior ciclo e de, indiretamente, viver em suas terras.
A presença de agentes ligados ao IEF nas terras dos lavradores é constante, de maneira tão insistente que chega a ser intimidadora. Grande é o êxodo de pessoas que, sem poder exercer sua força de trabalho, mudam para serem marginalizados na cidade.
Muitas famílias passam por graves dificuldades. Por não poderem mais produzir, falta-lhes alimento e demais recursos essenciais à sobrevivência digna.
Já foi constatado o falecimento de uma proprietária que, segundo a população local, foi agravada pelas amarguras experimentadas após as atividades do parque.
Os proprietários são totalmente ceifados de direitos constitucionalmente assegurados, como o da propriedade e de sua função social, bem assim da própria dignidade da pessoa humana.
Apesar de serem legítimos proprietários e/ou possuidores, foram indiretamente desapropriados pelo Estado, numa situação demasiadamente gravosa, eis que instalaram uma situação de indefinição, constrangimento e cerceamento de direitos inerentes à pessoa humana.
Nem o programa federal nominado “Luz Para Todos” atende ao povo da Serra Negra em virtude da criação do parque. Nos dias atuais, enquanto quase toda a zona rural do estado é atendida por energia elétrica, na região de Serra Negra a comunidade amargura tristes noites escuras e sem perspectivas de melhora.
Neste contexto, a Associação dos Defensores e Amigos da Serra Negra solicitou junto à comissão de Direitos Humanos da ALMG uma audiência pública, que acontecerá dia 24/11/2010, às 9:00, na sede da assembléia legislativa, com a finalidade de debater as questões expostas.