Januária se prepara para receber a 14° Romaria das Águas e da Terra de Minas Gerais
Lívia Bacelete
Comunicadora popular da Cáritas Regional Minas Gerais
Este ano, o de 2010, a Diocese de Januária, no Norte de Minas Gerais, irá receber a 14° Romaria das Águas e da Terra de Minas Gerais. A Romaria acontece no dia 18 de julho, na cidade de Januária, região da Bacia do Alto Médio São Francisco.
A equipe organizadora espera cerca de 9 mil romeiros de todo o estado. A equipe é formada por integrantes da Cáritas Diocesana de Januária, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Mitra Diocesana, Irmãs Paroquiais de São Francisco e da Divina Providência, Paróquia Sagrada Família e Nossa Senhora das Dores.
Com o tema “Terra e água partilhada, herança de Deus resgatada” e o lema “Nas terras e águas dos Gerais, a memória da resistência de nossos ancestrais”, a Romaria será um momento de anúncio da vitória da vida e da organização do povo e denúncia frente à violência do sistema capitalista neoliberal.
As Romarias das Águas e da Terra
As Romarias são momentos de fortes, manifestações religiosas, em que fé e vida movem o povo de Deus na busca pela transformação da atual sociedade excludente para o Reino de Deus. A construção deste lugar com “vida em abundância” para todos os filhos e filhas de Deus em comunhão com a criação, passa pela organização do povo que se coloca a caminho.
Em Minas Gerais, a Romaria das Águas e da Terra acontece desde 1996, como momento de celebração e reconhecimento da importância da Mãe Terra e Irmã Água. Esses bens vitais doados por Deus devem ser partilhados e preservados para as gerações futuras. São Francisco, patrono das romarias, é o símbolo da sociedade que queremos, na qual tudo e todos são irmãos a partir da Opção pelo Pobres.
A luta pela conquista e preservação da terra e da água sempre foi um tema complexo, principalmente numa região esquecida pelos governantes e dominada pela corrupção. No Norte de Minas, a Romaria das Águas e da Terra é um momento de anúncio e denúncia, na força do Espírito Santo e no seguimento de Jesus Cristo, frente à violência do sistema capitalista neoliberal.
Município de Januária
Com uma população de 67.516 habitantes, o município de Januária localiza-se no Norte de Minas Gerais, ao lado esquerdo do Velho Chico. Ele tem como base de desenvolvimento as riquezas doadas pelo São Francisco, impregnadas na vida dos pescadores, ribeirinhos, vazanteiros, quilombolas e indígenas. Riquezas como o artesanato, a produção de cachaça de alta qualidade, o extrativismo de frutos e essências do cerrado e a atividade turística, com área de praia do rio São Francisco, Balneário Pandeiros (48 km), Parque Nacional Caverna do Peruaçú (à 45 km) e Grande Sertão Veredas (Chapada Gaúcha à 165Km). Os valores e culturas do município foram herdados pela mística e ancestralidade de uma relação de troca e respeito das comunidades tradicionais com o Velho Chico.
Januária comemora 150 anos de emancipação política no dia 07 de outubro de 2010. Devido às más gestões públicas dos últimos anos, a população januarense sofre com as precárias condições nas áreas de saúde pública, estradas vicinais e esgotamento sanitário na área urbana. Como em outros municípios ribeirinhos, o rio São Francisco recebe o esgoto in natura de 35 mil habitantes, colocando em risco a vida do rio e de todo o povo que dele depende.
Diocese anfitriã da 14ª Romaria das Águas e da Terra
A Diocese de Januária foi fundada em 10 de outubro de 1958 e desde os seus primórdios contou com o incansável trabalho dos padres Missionários da Sagrada Família. Anfitriã da 14ª Romaria das Águas e da Terra, a Diocese acolheu a primeira romaria de Minas Gerais em 1996, no município de Manga. Em 2010, acolhe novamente a Romaria como momento propício de diálogo sobre o cuidado necessário com toda a criação, na consciência de que a nossa condição de filhos e filhas de “Deus Trindade nos convoca à comunhão: ecológica, política, social que não compactua com a fragmentação da vida”.
A Diocese é marcada pela presença de várias comunidades tradicionais: indígenas (Xakriabá, que resistem desde o século XVII); quilombolas (17 comunidades); pescadores; vazanteiros; ribeirinhos; geraizeiros e outras, que lutam para garantir e preservar seus territórios.
A resistência dessas comunidades é um forte exemplo de profecia e poesia. Ela denuncia a privatização das águas, do agronegócio, da violência do capital financeiro que “adequa o ser humano e a natureza ao fator econômico”. E anuncia a revitalização da bacia do rio São Francisco, que precisa ser popular e levar em consideração a vida do rio e do seu povo; a convivência com o semiárido e a descoberta das riquezas do sertão, que como diz Guimarães Rosa é “onde o pensamento da gente se forma mais do que o poder do lugar”. A força que vem da experiência das populações tradicionais é o que ensina a usufruir das dádivas divinas, sem se esquecer da preservação para as gerações futuras.
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