segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Acampamento Eloy Ferreira
Veja o que o MST está fazendo no Norte de Minas
Por frei Gilvander Moreira

Dia 02 de setembro de 2010, um advogado da RENAP , uma dirigente nacional do MST , um militante e eu, assessor da Comissão Pastoral da Terra – CPT/MG -, a 01:20h da madrugada, chegamos ao Acampamento Eloy Ferreira, do MST, no município de Engenheiro Navarro, no Norte de Minas Gerais, onde 300 famílias sem-terra, sob a liderança do MST, ocuparam a Fazenda Santo Eloy, na madrugada do dia 14 de agosto de 2010.

Às 06:00h, fizemos reunião com a coordenação do acampamento. Às 07:00h, Celebração Ecumênica e, após, Assembleia Geral. Às 08:30h, um juiz da Vara Agrária de Minas chegou ao acampamento. Com o juiz vieram um promotor da área de Conflitos Agrários, uma representante do INCRA , um do ITER , uma advogada do proprietário, dois filhos do dono e várias viaturas da polícia militar.


O juiz da Vara Agrária inspecionou todo o acampamento e a sede da fazenda e, em seguida, foi com sua comitiva vistoriar outras duas fazendas que estavam com Ação de Interdito Proibitório , temendo ocupação pelo MST. Enquanto isso, em vários ônibus, fomos para o Fórum de Bocaiúva, onde, das 13:00h às 16:00h, foi realizada uma Audiência Pública para discutir a ocupação da Fazenda Santo Eloy e o caso das duas fazendas que estão com Ação de Interdito Proibitório.

Eloy Ferreira da Silva, trabalhador rural e sindicalista, foi assassinado dia 16 de dezembro de 1984, quando era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais – STR – do município de São Francisco, no Vale do São Francisco, Norte de Minas Gerais. Eloy foi um ardoroso lutador da reforma agrária. Enfrentou o coronelismo. Mesmo ameaçado de morte, não fugiu. Doou sua vida para ver a terra libertada e partilhada. Sobre ele, a CPT/Minas editou o livro “Morre uma voz, nasce um grito”.

Veja o tamanho da injustiça social:
De um lado, a Fazenda Santo Eloy possui cerca de 1.400 hectares e está abandonada há décadas. Toda desmatada, hoje, a fazenda é só monocultura do capim. Até as matas ciliares foram desmatadas para se plantar capim. O proprietário reside no Rio de Janeiro e há 13 anos não visita a fazenda. O encarregado da fazenda cuida de apenas algumas dezenas de cabeça de gado e tira menos de 100 litros de leite por dia. O vaqueiro, às vezes, dorme no curral. Tem carteira assinada? Quanto ganha? Na fazenda não se planta nem um pé de feijão, nem milho, nem arroz e nem verdura. Nada. Só capim foi plantado. A fazenda está penhorada por uma dívida trabalhista de 218 mil reais. Assim, o proprietário não cumpre há muito tempo o princípio constitucional da função social da propriedade.
De outro lado, no município de Engenheiro Navarro, com 9 mil habitantes, só o prefeito, “os seus” e uma pequeníssima minoria têm boas condições de vida. Quatro mil pessoas já foram obrigadas a migrar para a periferia de grandes cidades em busca de emprego. Todos os anos, de fevereiro/março a dezembro, um grande número de trabalhadores – mais de 200 mil no Norte de Minas – vai ser bóia-fria na imensa monocultura de cana-de-açúcar no estado de São Paulo e na monocultura do café no Sul de Minas. Viúvas de maridos vivos são obrigadas a assumirem sozinhas as famílias, carregando sobre si o fardo pesado da injustiça social e da ausência dos companheiros. Quem não vai embora vive trabalhando nas fazendas da região como bóias-frias, diaristas, fazendo bico ou vivendo de favor, de caridade, com ajuda de parentes que migraram. Muitas famílias recebem 68 reais por mês – uma migalha - de bolsa família do Governo Federal. Mas há ainda muitas famílias pobres que nem bolsa família recebem.

NOTA DA CPT/MG e da ABRA, em 21/08/2008, diz assim: “14 bóias-frias mortos pelo capitalismo e seus comparsas. Tragédia do Modelo de “desenvolvimento” do Campo Brasileiro. Nós da Comissão Pastoral da Terra – CPT – e da Associação Brasileira de Reforma Agrária – ABRA –manifestamos nossa indignação e exigimos justiça em vista da tragédia que resultou na morte de 14 bóias-frias e 18 feridos, entre os quais vários ficaram paralisados em cima da cama, que trabalhavam na lavoura do café na fazenda Vargem Grande, propriedade de José Ananias Coutinho, dia 19 de agosto de 2008, na cidade de Santo Antônio do Amparo, no trecho da rodovia Fernão Dias (no Sul de Minas), quando um caminhão velho que transportava 32 bóias-frias tombou.” O DER concedeu licença para trafegar ao dono de um caminhão velho sem condições de tráfego. Esse crime continua impune. O processo foi arquivado pelo Ministério Público. As vítimas não foram nem indenizadas.



Sob a presidência do Dr. Aguinaldo, juiz da Vara Agrária, na Audiência Pública, com a presença de todos os atores, citados acima, com auditório lotado de Sem Terra do MST, foi celebrado três acordos judiciais:
1) As duas fazendas que requereram Ação de Interdito Proibitório serão vistoriadas pelo INCRA. O ITER investigará se há nelas terras devolutas ou não. As vistorias iniciar-se-ão até o dia 5 de novembro próximo.
2) Como o Governo Lula manteve a Lei 8.629/93, do Governo FHC , que proíbe vistoria em fazenda ocupada durante dois anos, diante da disposição das 300 famílias Sem Terra do MST de não abrir mão da fazenda Santo Eloy, os dois filhos do proprietário concordaram que o INCRA faça a vistoria da fazenda, o que, certamente, comprovará a improdutividade e o não cumprimento da função social da propriedade. O INCRA assumiu o compromisso de terminar a vistoria até o dia 5 de março de 2011. Até lá as 300 famílias do Acampamento Eloy Ferreira poderão continuar no acampamento e plantar cinco hectares de terra. Deverão ainda preservar o pouco de meio ambiente que ainda existe na fazenda e pagar a conta de energia mensalmente.

Em clima de festa, ao chegar ao Acampamento Eloy Ferreira, retornando da Audiência Pública, as famílias soltaram uma caixa de foguetes para comemorar essas três vitórias. A família Sem Terra gritou jubilosa: Pátria livre! Vencemos e venceremos!
Enfim, mais um latifúndio - que estava seqüestrado em poucas mãos -, agora, está sendo libertado. Viva a luta pela reforma agrária e por justiça no campo!




Clic no link, abaixo, e assista reportagem de frei Gilvander Moreira sobre o Acampamento Eloy Ferreira: http://www.youtube.com/watch?v=Lnq1Y2GdZuM

Obs.: A reportagem, em vídeo, pode ser vista também a partir de www.gilvander.org.br ou de www.cptmg.org.br

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